terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

O PÃO NOSSO
Herbert de Souza
(Reflexões para o futuro, Edição Veja 25 anos, São Paulo: Abril)

*** Com a força de quem incomoda pela simplicidade de seus argumentos, o sociólogo mineiro desmonta qualquer desculpa para não encarar a fome no Brasil. Tratamos 32 milhões de pobres - uma Argentina inteira -como estrangeiros, inimigos. ***

Há quase quarenta anos, eu começava minha trajetória de esquerda cristã,para depois percorrer todos os caminhos e desvios do marxismo, do leninismo e do maoísmo, quando publiquei meu primeiro artigo, na revista francesa "Témoignage Chrétien". chamei-o "Capitalismo e Miséria". Era 1956 e naquele tempo a luta contra o capitalismo inspirava-se numa ética humanista,que não aceitava a miséria. Ser de esquerda era isso.

Ao longo dos anos, as razões para lutar contra o capitalismo foram aumentando, a ética foi cedendo espaço para a ideologia. Lutar contra a miséria passou a ser um subproduto da luta pelo socialismo. No futuro o socialismo acabaria com a miséria, ao fim de um período de convivência inevitável. Restava, como forma de ação, denunciar a responsabilidade do capitalismo na produção da miséria. Mas a convivência acabou por gerar um inconformismo verbal e um conformismo prático.

O mundo deu muitas voltas. Caíram barreiras, referências, mitos e muros. A História não coube em teorias. As teorias negaram suas promessas. O capitalismo continuou produzindo miséria, mas o socialismo avançou sem conseguir eliminá-la.Os sistemas protegiam seus sócios e eliminavam os demais. Depois de 100 anos de socialismo e capitalismo, a miséria no mundo aumentou, a economia transformou-se num código de brancos e numa fábrica de exclusão racionalizada. A modernidade produziu um mundo menor do que a humanidade. Sobram bilhões de pessoas. Não se previu espaço para elas nos vários projetos internacionais e nacionais. No Brasil essa exclusão tem raízes seculares. De um lado, senhores, proprietários, doutores. Do outro, índios, escravos, trabalhadores, pobres.

Isso significa produzir riqueza pela produção da pobreza. Sendo um modelo econômico sustentado em vícios sociais, o padrão rural da colônia transferiu-se praticamente intacto ao país urbano, com pretensões a ser moderno. O Brasil tem uma indústria com duas caras - e a mesma moeda. Moderna na tecnologia, atrasada nas relações de trabalho. Sua classe média espreme-se entre a ideologia do senhor e as agruras dos pobres. Teme o destino de um e respeita o poder do outro.

A industrialização brasileira não encurtou o abismo entre pobres e ricos. Os senhores viraram empresários, mas continuaram a viver em novas versões da casa-grande. Os escravos viraram trabalhadores, mas continuaram morando na senzala, em dormitórios feitos para isolar o pobre depois do serviço.

Nos anos 90, aprendemos que, em sessenta anos de industrialização, o Brasil havia gerado três categorias sociais - ricos, pobres e indigentes. É como se elas habitassem países diferentes. Existe a minoria rica, branca, sofisticada, formando uma sociedade mais ou menos comparável à do Canadá. Tem a maioria pobre, negra, silenciosa e resignada, do tamanho do México. E há 32 milhões de indigentes, uma Argentina dentro do Brasil.Esses 32 milhões são brasileiros que o Brasil trata como estrangeiros,uma população indesejada, descurada, quase inimiga.

Este Brasil onde aparentemente não cabem os 150 milhões de habitantes das estatísticas demográficas é assim por descaso. Com a produção agrícola atual, poderia alimentar 300 milhões de pessoas. Nada, em sua economia,impede que sejam gerados agora 9 milhões de empregos de emergência. Se a posse da terra fosse democratizada de maneira rápida e decidida, abriria lugar para 12 milhões de famílias. Se as coisas assim acontecessem, 32 milhões de pessoas que estão passando fome teriam comida, pelo menos comida.

Ser de esquerda é ter pressa de chegar ao futuro. Mas como projetar o futuro no quadro trágico do Brasil de hoje? Os indigentes indicam a rota de um grande naufrágio social, de uma farsa econômica e de um desastre político. Fome, miséria e Aids vão disputar as manchetes da imprensa internacional sobre o país. Fome e miséria porque as produzimos há muito tempo. Aids porque tem, aqui, a mesma cara da miséria. A minoria rica trata-se, os pobres simplesmente morrem.

Projetar o futuro é temer ou desejar. Prever também pode ser identificar os desejos e interesses existentes agora, é reconhecer a possibilidade de que os melhores desejos sejam os desejos dominantes e com isso se transformem na realidade. Pensar o futuro atrai, desafia e engana. E mudar o futuro depende de mudar a maneira como se pensa o presente. O futuro começa hoje. Num passado recente, quando o sindicalismo parecia inteiramente domado pela repressão militar, as greves no ABC paulista desafiaram a imaginação dos sociólogos e a força policial do governo. No passado ainda mais recente, as campanhas da anistia, das eleições diretas, da Constituinte, do impeachment de Collor - todas elas mostraram o poder que tem o desejo de mudar a realidade.

Não faltam argumentos para quem imagina o futuro como o presente piorado. Se o modelo "Casa Grande & Senzala" prevalecer, não haverá outro recurso senão viver numa prisão de ruas fechadas por seguranças privadas, em "bunkers" residenciais. Nesse caso, o futuro brasileiro terá, pelo cinismo e pela indiferença, a sociedade que a África do Sul fez no passado pelo racismo e pela violência.

E o outro lado? E se o futuro depender da explosão social dos oprimidos? Aí é provável que o sistema atual também prevaleça. Não é à toa que ele tem antecedentes históricos.Sempre que preciso, a polícia torturou e matou, as Forças Armadas reprimiram sublevações contra a ordem da classe dominante, as Igrejas ensinaram resignação em vez de horror à injustiça. Deus alegrava a vida dos ricos. O diabo metia medo nos pobres. O brasileiro cordial,produto desse método, é aquele cidadão que ganha salário mínimo e brinca o Carnaval com alegria de fazer inveja ao turista. O Rio de Janeiro não é Los Angeles.

Pode haver revolta. Mas é improvável que seja o caminho da mudança no Brasil. Ela não corre, mas anda. Não corre, mas ocorre.

Seus sinais estão, por exemplo, no melhoramento das cidades em plena crise da administração federal, no basta à corrupção e no movimento pela ética na política, na emergência de movimentos em favor da mulher, da criança ou na ecologia, no anti-racismo. São antídotos contra a cultura autoritária que sempre ditou a receita do desastre social. Eles estão na confluência de duas tendências. Parte da elite não quer viver no apartheid sul-africano. E cada vez mais pobres querem sua cota de cidadania. Essa maré vai empurrando a democracia da sociedade para o Estado, de baixo para cima, dos movimentos sociais para os partidos e instituições políticas.

É nela que eu hoje acredito. E, por causa dela, encontro-me outra vez com a velha questão que me levou à militância política: o que fazer com a miséria? Aceitá-la a título provisório? não dá; aquilo que produz miséria simplesmente não pode ser aceito. A condenação ética da miséria passou a ser a luta contra a miséria para conquistar a democracia.

É preciso começar pela miséria. Essa é a energia da mudança que move a Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida, revelada na adesão de pessoas de todas as classes sociais, idades, tendências políticas e religiosas, parlamentares e prefeitos, empresas públicas e privadas , artistas e meios de comunicação e, sobretudo, na adesão de jovens à tarefa de recolher e distribuir alimento. Essa juventude está descobrindo o gosto de romper o círculo de giz da solidão e abrir o espaço fecundo da solidariedade. Esse mesmo gosto que há quarenta anos se reservava à militância.

No combate à fome há o germe da mudança do país. Começa por rejeitar o que era tido como inevitável. Todos podem e devem comer, trabalhar e obter uma renda digna, ter escola, saúde, saneamento básico, educação, acesso à cultura. Ninguém deve viver na miséria. Todos têm direito à vida digna, à cidadania. A sociedade existe para isso. Ou, então, ela simplesmente não presta para nada. O Estado só tem sentido se é um instrumento dessas garantias. A política, os partidos, as instituições, as leis só servem para isso. Fora disso, só existe a presença do passado no presente, projetando no futuro o fracasso de mais uma geração.

Quando eu era cristão e queria lutar contra a miséria, meu dia começava com um Padre-Nosso. Tinha fome de divindade. Hoje, ainda luto contra a miséria, mas meu dia começa com um Pão Nosso. Tenho fome de humanidade.

A USP e a estrutura de dominação do sistema
Este é o post de número 666. Vou dedicá-lo à USP.
Eu sempre disse que a USP é um centro de formação da classe dominante. É uma Universidade pública que foi feita para servir à elite e aos grupos dominantes. Ela não foi feita para as classes baixas e nem para a coletividade ou para a maioria da população. E isto pode ser visto em várias ações dessa Universidade.

É uma Universidade que fixa, alimenta e reproduz o pensamento dos grupos dominantes. Passando as normas e regras de dominação de geração para geração.

A função da USP, dentro da estrutura de dominação, é manter intacto o pensamento hegemônico e dissimulá-lo, o máximo possível, nas informações e nos conhecimentos ensinados, nos projetos e pesquisas que realiza. Não só isto, como já dissemos, a USP, assim como outras Universidades Públicas, mas mais a USP, por ser hegemônica, forma a elite que opera o sistema de dominação. Autoridades públicas importantes e grandes capitalistas estudaram na USP, seja na graduação ou pós-graduação, ou são influenciados por professores da USP.

Se tanta gente importante do sistema passaram pela USP ou são influenciados por professores da USP, por que as coisas não mudam ? Não mudam porque a USP não foi feita para promover mudanças na sociedade. Foi feita para manter o status quo, a dominação de uma minoria rica sobre a maioria.

Por que você acha que existem poucos estudantes da escola pública na USP ? Por que os pobres são minorias aqui ? Por que os negros, que são a maioria da população, são minoria na USP ? Por que a definição de mérito, usada pela USP, é uma coisa que só os ricos tem ? Porque a USP é um centro de formação da elite, dos grupos dominantes. Porque a USP foi feita para reproduzir e perpetuar a dominação da minoria branca rica sobre a maioria de negros e pobres.

Olhem para as cotas... A USP não aceita o sistema de cotas. Diz que ela viola o mérito que só os ricos tem. Olhem para o sistema de pós-graduação da USP, a maioria dos pós-graduandos pertencem aos grupos dominantes. Os concursos para professor da USP são a mesma coisa. Para manter o sistema de dominação é preciso que os professores e a maioria dos alunos pertençam aos grupos dominantes, caso contrário a coisa não funciona.

E eles são tão diabólicos que mantém esta estrutura de dominação rodando bem na frente da cara de todo mundo. E pior, ainda mandam a conta para a maioria da população, os negros e pobres, pagarem. Em outras palavras, a USP é um centro de formação da elite. Os herdeiros dos grupos dominantes, da dominação, da opressão, da exclusão e da exploração, estão todos estudando aqui. E quem está pagando os estudos deles: os dominados, os oprimidos, os excluídos e os explorados.

Mas e os indivíduos das classes baixas que entram na USP ? O que eles fazem ? Quando entram, é em curso pouco concorrido ou de baixo poder de decisão dentro do sistema de dominação.

Se entram em cursos da elite, são transformados em operadores do sistema de dominação. Viram advogados do sistema, políticos do sistema, administradores de grandes empresas e bancos, etc. Esquecendo, completamente, o lugar de onde saíram ou de onde vieram. Pior do que isto, nada fazem para que o sistema de dominação seja quebrado, para que as portas da Universidade sejam abertas para todos, para a coletividade, para a maioria da população.

Enfim, de uma forma geral, o estudante da classes baixas acabam sendo assimilados ou cooptados, dentro da USP, pelos sistema de dominação. Além disso, podem ser doutrinados e formatados para aceitarem a opressão e a exploração do sistema, para ficarem passivos e resignados diante do mal e das injustiças. Falam em não-violência, em social-democracia, paz, etc, não percebendo que tudo isto é truque do sistema para evitar a revolução.

E isto não mudará... enquanto existir o sistema de dominação e uma minoria de grupos dominantes, a USP continuará sendo o que é e fazendo o que faz. Ela integra uma estrutura maior de dominação.

Uma estrutura que está ligada com a política, mais especificamente, com a democracia representativa. A democracia representativa é a democracia dos grupos dominantes. É a democracia de uma minoria dominando a grande maioria.

Está ligada com a estrutura de dominação do judiciário e da administração pública. Olhe para os concursos públicos, não são parecidos com os méritos da USP ? Nestes concursos, a maioria da população, principalmente os pobres e negros, estão completamente excluídos. Primeiro, porque exigem diplomas. Segundo, porque as provas são mais difíceis que o vestibular e só passa quem paga cursos caríssimos...

O que mudará esta realidade ? Uma revolução... Todo o sistema tem que ser quebrado. Toda a estrutura tem que ser modificada.
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Teorias sobre a educação escolar e a desigualdade
Bernstein: Códigos de linguagem
Anthony Giddens -- Sociologia --artmed -- 2005 -- p.412-414
Existem várias perspectivas teóricas sobre a natureza da educação moderna e suas implicações para a desigualdade. Uma dessas abordagens é a que enfatiza as habilidades linguísticas.

Na década de 1970, Basil Bernstein defendeu a tese de que crianças de origens diversas desenvolvem códigos diferentes, ou tipos de fala, na fase inicial da vida, as quais afetam suas experiências posteriores na escola. Seu interesse não está nas diferenças de vocabulário ou de habilidades verbais, como normalmente se sugere, mas nas diferenças sistemáticas no emprego da linguagem, especialmente no contraste entre as crianças mais pobres e as mais ricas.

O modo de falar das crianças pertencentes à classe trabalhadora, afirma Bernstein, representa um código restrito - uma forma de utilizar a linguagem que contém muitas suposições não-declaradas que os falantes esperam que os outros reconheçam. Um código restrito é uma espécie de discurso vinculado ao seu próprio cenário cultural.

Muitos indivíduos da classe trabalhadora vivem em uma cultura muito voltada à família ou ao bairro, na qual se parte do pressuposto de que todos conhecem os valores e as normas sem expressá-los através da linguagem. Os pais tendem a socializar seus filhos empregando diretamente recompensas ou repreensões para corrigir seu comportamento.

Em um código restrito, a linguagem adapta melhor à comunicação de experiências práticas do que à discussão de idéias, processos ou relações mais abstratas. Assim, o discurso do código restrito é típico de crianças que crescem em famílias de classe baixa e dos grupos sociais com os quais elas convivem. O discurso é orientado para as normas do grupo, sem que ninguém consiga explicar facilmente o motivo de estar seguindo os padrões de comportamento que segue.

Bernstein acredita que o desenvolvimento da linguagem das crianças da classe média, em contraste, envolve a aquisição de um código elaborado - um estilo de discurso em que os significados das palavras podem ser individualizados para satisfazer às demandas de situações específicas. Os modos pelos quais as crianças da classe média aprendem a utilizar a linguagem são menos vinculados a contextos particulares; as crianças conseguem fazer generalizações e expressar idéias abstratas com maior facilidade.

Dessa forma, quando mães de classe média controlam seus filhos, elas freqüentemente explicam os motivos e os princípios que estão por trás de suas reações ao comportamento da criança. Enquanto uma mãe da classe trabalhadora pode repreender seu filho por querer comer muitos doces dizendo simplesmente "Chega de doces !", é mais provável que uma mãe da classe média explique que exagerar nos doces faz mal à saúde e estraga os dentes.

Crianças que adquiriram códigos elaborados de fala, sugere Bernstein, têm mais condições de lidar com as exigências da educação acadêmica formal do que aquelas que se limitaram a códigos restritos. Isso não significa que o tipo de discurso das crianças da classe trabalhadora seja "inferior", ou que seus códigos de linguagem sejam "pobres", mas, sim, que o seu modo de falar não combina com a cultura acadêmica da escola. Aqueles que dominam códigos elaborados se adaptam com muito mais facilidade ao ambiente escolar.

Há evidências que fortalecem a teoria de Bernstein, mesmo que sua validade ainda seja discutida. Joan Tough (1976) estudou a linguagem das crianças da classe trabalhadora e da classe média, encontrando diferenças sistemáticas. Ela confirma a tese de Bernstein de que as crianças da classe trabalhadora geralmente têm menos oportunidades de ouvir respostas para suas perguntas ou explicações sobre o raciocínio dos outros. À mesma conclusão chegaram Barbara Tizard e Martin Hughes (1984) em uma pesquisa posterior.

As idéias de Bernstein nos auxiliam a entender por que pessoas que provém de determinados meios sócio-econômicos tendem a ter um desempenho abaixo do seu potencial na escola. São estes os traços associados ao discurso do código restrito que inibem as chances de uma criança em termos educacionais;

-- A criança provavelmente recebe respostas limitadas às perguntas que faz em casa; logo, é provável que ela fique menos bem-informada e menos curiosa em relação ao mundo em um sentido mais amplo do que aquelas que dominam códigos elaborados.

-- A criança encontrará dificuldades para responder à linguagem impassível e abstrata empregada no ensino, bem como aos apelos em relação aos princípios gerais da disciplina escolar.

-- É provável que muito do que o professor disser seja incompreensível para a criança, pois ele empregará a linguagem de uma forma com a qual a criança não está acostumada. Para lidar com esse problema,a criança não está acostumada. Para lidar com esse problema, a criança talvez tente traduzir a linguagem do professor para algo que lhe seja familiar - mas, nesse caso, é possível que ela deixe de compreender justamente os princípios que o professor pretende transmitir.

-- Embora decorar ou repetir não sejam atividades muito difíceis para a criança, ela pode encontrar grandes dificuldades para entender distinções conceituais que envolvem generalizações e abstração.
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Illich: o currículo oculto
Um dos autores mais controversos da teoria educacional é Ivan Illich. É reconhecido por suas críticas ao desenvolvimento econômico moderno, que ele descreve como um processo por meio do qual as pessoas, que anteriormente eram auto-suficientes, são privadas de suas habilidades tradicionais e obrigadas a dependerem de médicos que tratem de sua saúde, professores que as ensinem, televisão que as divirta e patrões que garantam sua subsistência.

Illich argumenta que a própria noção da obrigatoriedade da educação escolar - hoje aceita no mundo inteiro - deveria ser questionada (1973).

O autor enfatiza o elo existente entre o desenvolvimento da educação e as exigências da economia por disciplina e hierarquia. Illich afirma que as escolas evoluíram para lidar com quatro tarefas básicas: o cuidado custodial, a distribuição dos indivíduos em papéis ocupacionais, o aprendizado de valores dominantes e a aquisição de habilidades e conhecimento que sejam socialmente aprovados.

Quanto ao primeiro item, a escola tornou-se uma organização custodial, pois a freqüência nas aulas é obrigatória, e as crianças são mantidas longe das ruas desde a infância até o ingresso no mercado de trabalho.

Muito do que se aprende na escola não tem nada a ver com o conteúdo formal das aulas. As escolas tendem a inculcar o que Illich (1973) definiu como consumo passivo - uma aceitação irrefletida da ordem social existente - por meio da natureza da disciplina e da arregimentação que envolvem. Essas ligações não são ensinadas conscientemente, estando implícitas nos procedimentos e na organização escolares. O currículo oculto ensina à criança que seu papel na vida é conhecer o seu lugar e ficar sentada quietinha nele.

Illich defende uma sociedade sem escolas. A obrigatoriedade da educação escolar é uma invenção relativamente recente, salienta ele; não há por que aceitá-la como se fosse algo de certa forma inevitável. Já que as escolas não promovem a igualdade ou o desenvolvimento de habilidades criativas individuais, por que não abolirmos o seu formato atual ?

Com isso, Illich não quer dizer que todas as formas de organização educacional devam ser extintas. Todo aquele que quiser aprender deve ter acesso aos recursos disponíveis - em qualquer momento da vida, não apenas na infância ou na adolescência. Um sistema assim possibilitaria a ampla difusão e divisão do conhecimento, que não ficaria limitado aos especialistas.

Os estudantes não deveriam ter de se submeter a um currículo-padrão, devendo ter possibilidade de escolha em relação ao que estudam.

O que tudo isso significa em termos práticos não está totalmente claro. No lugar das escolas, entretanto, Illich sugere que haja diversos tipos de estrutura educacional. Recursos materiais para o aprendizado formal seriam guardados em bibliotecas, locadoras, laboratórios e bancos de armazenamento de informações, disponíveis a qualquer estudante.

Seriam instaladas "redes de comunicações" que ofereceriam dados a respeito das habilidades de vários indivíduos e de sua disposição para ensinar outras pessoas ou se envolver em atividades de aprendizado mútuo. Os estudantes receberiam vales que lhes possibilitariam utilizar os serviços educacionais quando e como eles desejassem.

Será que essas propostas são completamente utópicas ? Muitos diriam que sim. Mas caso, no futuro, haja uma redução ou uma reestruturação substancial do trabalho remunerado, como aparentemente é possível, essas idéias parecerão menos irrealistas. Se o emprego assalariado adquirisse um papel menos central na vida social, as pessoas poderiam se envolver em uma variedade maior de atividades.

Diante desse quadro, algumas das idéias de Illich fazem bastante sentido. A educação não seria apenas um primeiro treinamento, limitado a instituições especiais, mas ficaria à disposição de quem quisesse aproveitá-la.

As idéias de Illich, divulgadas na década de 1970, entraram novamente na moda nos anos de 1990 com o avanço das novas tecnologias das comunicações. Como vimos, algumas pessoas acreditam que os computadores e a internet possam revolucionar a educação e reduzir as desigualdades.

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Bourdieu: educação e reprodução cultural
A maneira mais esclarecedora de associarmos alguns dos temas dessas perspectivas teóricas talvez seja por meio do conceito de reprodução cultural (Bourdieu, 1986, 1988; Bourdieu e Passeron, 1977).

A reprodução cultural refere-se às formas pelas quais as escolas, juntamente com outras instituições sociais, ajudam a perpetuar desigualdades econômicas e sociais ao longo de gerações.

O conceito direciona nossa atenção aos meios pelos quais as escolas, através do currículo oculto, influenciam o aprendizado de valores, atitudes e hábitos. As escolas reforçam as variações nos valores culturais e nas visões selecionadas nos primeiros anos da vida; quando as crianças deixam a escola, essas variações têm o efeito de limitar as oportunidades de algumas crianças ao mesmo tempo que facilitam as de outras.

Não há dúvidas de que os modos de emprego da linguagem identificados por Bernstein estão relacionados a essas óbvias diferenças culturais, que subjazem às variações de interesses e de gostos.

Crianças provenientes da classe baixa, e muitas vezes de grupos minoritários, desenvolvem formas de conversar e de agir que estão em desarmonia com aquelas que imperam na escola. As escolas impõem regras de disciplina aos alunos, a autoridade dos professores volta-se para o aprendizado acadêmico.

As crianças da classe trabalhadora sofrem um baque cultural bem maior ao entrarem na escola do que aquelas que vêm de lares mais privilegiados - na realidade, as primeiras têm a impressão de estarem em um ambiente cultural estrangeiro. Não apenas é menos provável que elas encontrem motivação em alcançar um alto nível de desempenho acadêmico, mas também sua maneira habitual de falar e de agir, como defende Bernstein, não combina com a dos professores, mesmo que cada um faça o melhor para se comunicar.

As crianças passam bastante tempo na escola. Como enfatiza Illich, elas aprendem muito mais lá do que é oficialmente ensinado nas aulas. Bem cedo, as crianças têm uma amostra do que vai ser o mundo do trabalho, aprendendo que deverão ser pontuais e diligentes nas tarefas determinadas por aqueles que estã em posição de autoridade (Webb e Westergaard, 1991).

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Willis: uma análise da reprodução cultural
Uma célebre discussão a respeito da reprodução cultural aparece no relatório do estudo de trabalho de campo executado por Paul Willis em uma escola de Birmingham (1977). Mesmo tendo sido realizado há mais de duas décadas, esse estudo continua sendo um clássico da investigação sociológica.

Willis propôs a seguinte questão para investigação: como ocorre a reprodução cultural - ou como ele a colocou, "como os filhos da classe trabalhadora arranjam empregos na classe trabalhadora."

Normalmente se imagina que, durante o processo da educação escolar, crianças que provenham de meios de classe baixa ou de minorias simplesmente acabem percebendo que "não são inteligentes o bastante" para esperar conseguir empregos que garantam um status elevado e altos salários no futuro.

Em outras palavras, a experiência do fracasso acadêmico as ensina a reconhecer suas limitações intelectuais; aceitando sua "inferioridade", elas partem para ocupações com perspectivas de carreira limitadas.

Como enfatiza Willis, essa interpretação não está absolutamente de acordo com a realidade da vida e das experiências das pessoas. A "sabedoria das ruas" dos indivíduos que vêm de bairros pobres pode ter pouca ou nenhuma relevância para o sucesso acadêmico, porém envolve um conjunto de habilidades tão sutil, engenhoso e complexo quanto qualquer outra prática intelectual ensinada na escola.

Poucas crianças, se é que alguma, saem da escola pensando "sou tão burra que mereço passar o dia empilhando caixas em uma fábrica." Se as crianças de origem menos privilegiada aceitam trabalhos braçais, e não se sentem fracassadas pelo resto da vida, é porque deve haver outros fatores envolvidos na questão.

Willis concentrou-se em um grupo específico de garotos na escola, passando bastante tempo com eles. Os membros dessa turma, que se autodenominavam "os caras", eram brancos; a escola também tinha muitas crianças de famílias das Índias Ocidentais e da Ásia. Willis descobriu que esses rapazes tinham uma compreensão crítica e perspicaz do sistema de autoridade da escola - mas a utilizavam para combater esse sistema, e não para trabalhar a seu favor.

Eles viam na escola um ambiente hostil, mas que poderia ser manipulado para seus próprios objetivos. Tiravam prazer dos conflitos constantes - que, na maioria das vezes, eles mantinham em função de pequenas rixas - com os professores. Tornavam-se peritos em enxergar os pontos fracos das reclamações dos professores por autoridade, assim como os seus pontos vulneráveis enquanto indivíduos.

Na sala de aula, por exemplo, as crianças deveriam ficar sentadas e quietas e dar continuidade aos seus trabalhos. Mas "os caras" passavam o tempo todo se mexendo, exceto nos momentos em que o olhar fixo do professor pudesse imobilizá-los por um instante; ficavam fofocando dissimuladamente, ou faziam comentários em voz alta que beiravam à insubordinação, mas que poderiam ser explicados caso fossem contestados.

"Os caras" reconheciam que o trabalho seria parecido com a escola, mas não viam a hora de começarem a trabalhar. Não esperavam obter uma satisfação direta com o ambiente de trabalho, mas aguardavam com impaciência o momento de receberem um salário. Longe de considerarem as funções que exerciam - em trabalhos de borracharia, colocação de carpetes, encanamentos, pintura e decoração - atividades inferiores, eles demonstravam a mesma atitude de superioridade diante do trabalho que tinham em relação à escola. Gostavam do status de adulto que o trabalho proporcionava, mas não estavam interessados em "construir uma carreira".

Como salienta Willis, o trabalho em ambientes de produção, muitas vezes, envolve aspectos culturais bem semelhantes àqueles criados por esses rapazes em sua cultura de oposição à escola - brincadeiras, raciocínio rápido e habilidade para subverter as exigências das figuras de autoridade quando necessário. Só depois de muito tempo é que eles podem acabar percebendo que estão presos em um trabalho árduo, que não traz recompensas. Quando possuem uma família, é possível que olhem para o passado e percebam - sem esperanças - que a educação teria sido sua única saída. Entretanto, se tentam passar essa visão para seus próprios filhos, estes provavelmente não terão mais sucesso na vida do que seus pais o tiveram.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Encrenca com Professor da USP
Disse-me um Professor da USP "(...) não acho que a Bolsa de Iniciação seja feita para sustentar o aluno, é apenas uma ajuda." Disse isto em resposta ao meu email de que precisaria preencher os formulários para pedir uma bolsa de iniciação para continuar a pesquisa que estou fazendo agora.

Estou desenvolvendo e escrevendo esta pesquisa na raça e embaixo de sabotagem e fogo cruzado, uma pesquisa importantíssima. Enquanto levo a pesquisa nas costas e sem bolsa, tem um monte de gente dentro da USP recebendo duas ou três bolsas para produzir lixo. Para as minhas pesquisas as bolsas não são importantes... para os lixos que produzem por aí, recebem até financiamento internacional...

Contudo, certamente, a visão do professor está completamente errada. Se a bolsa de iniciação, o mesmo se aplica à bolsa de mestrado e doutorado, são apenas ajuda de custo, então, por que a lei obriga o aluno, que recebe estas bolsas, a abandonar todas as demais atividades remuneradas que exerce ? Cumular a bolsa com outra atividade remunerada é ilícito, inclusive se o individuo for pego cumulando, ele é punido: perde a bolsa, tem que devolver o dinheiro, etc... As bolsa são mais do que ajuda, é o "salário" por um trabalho que está sendo realizado...

Mas a questão aqui é outra. É a visão. A bolsa, da perspectiva do aluno, é o que o manterá estudando e pesquisando. Este aluno faz parte da maioria da população. A maioria oprimida que faz coisa relevante para este país. Já o professor tem outra visão. Ele é da classe dominante, da pequena elite opressora e dominante. Ele não precisa de bolsa, pois já tem outras fontes milionárias de recursos, logo, ele se dá ao luxo de ver nas bolsas de pesquisa somente ajuda de custo. Nada mais. Esta é a mentalidade da classe dominante: bolsa é ajuda de custo, programa social é paternalismo, etc.

Contudo, este email me mostrou uma outra coisa que eu não tinha percebido. Eu sou um subversivo radical. Ataco o sistema frontalmente e planejo destruir completamente este sistema dominate, opressor, excludente e explorador. Logo, submeter as minhas idéias e as minhas teorias aos operadores deste sistema é um coisa contraditória. Muito contraditória. É como se eu estivesse sentando à mesa com as pessoas que, mais tarde, terei de destruir. Muitos dirão que eu estou pedindo a benção dos grupos dominantes às minhas idéias e verão em mim, nada mais, do que um traidor...

Esta não é uma visão maniqueísta. É uma visão lógica. Quem reproduz o sistema opressor, quem alimenta a cultura da dominação (para os grupos dominantes) e da submissão, não-violência, falso Estado de Direito, etc, para a maioria oprimida, são as universidades. São as universidades que formam os dominadores, opressores e exploradores. São as universidades que domesticam os subversivos e os pensadores que vem das classes baixas, amarrando os com normas, regras e ameaças; ao mesmo tempo em que introjeta em suas cabeças a cultura da servidão, da escravidão e da domesticação.

As universidades transformam aquelas pessoas que podem lutar e destruir o sistema de dominação, opressão, exclusão e exploração em operadores do próprio sistema. Isto perpetua a escravidão, pois elimina, completamente, os líderes da resistência. As Universidades apagam a revolução e domesticam os rebeldes.

Se a Universidade é um centro de formação dos dominadores e opressores, ela terá que cair quando o sistema for derrubado. E quem contaminou a Universidade com seu veneno e ajudou a dominar e oprimir, também tem que ser enterrado junto com o sistema.

Isto me faz pensar que eu não devo submeter minhas idéias e meus projetos à avaliação da classe dominante. Também considerou que os títulos outorgados pelos grupos dominantes, certificando que estas idéias e projetos estão de acordo com a sua dominação e com a opressão que praticam (títulos de mestre, doutor, etc), não são relevantes e não servirão para nada quando o sistema cair. Logo, devo retirar minhas idéias e meus projetos da USP e do Brasil. Talvez eu devesse paralisar tudo e dedicar-me a destruir o sistema. Depois, no novo céu e na nova terra, eu retorno aos meus estudos contemplativos.

Portanto, dois caminhos se abrem diante de mim, neste momento. Primeiro, afundar de vez e de cabeça na luta de resistência, acelerando a destruição do sistema e de seus operadores ou, então, seguir para uma universidade estrangeira, onde eu possa terminar a teoria e os meus estudos contemplativos. Atiçando e orientando de lá a destruição do sistema.

A imagem que eu tenho para a situação na qual estou agora é de um judeu, em plena dominação nazista, na Universidade de Berlim, estudando borboletas. Enquanto isto, ao redor da Universidade, os campos de concentração funcionam a todo vapor e as chaminés das câmaras de gás não param de jogar cabelos no escritório do judeu que estuda borboletas...

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

A dominação e a opressão dos brancos contra negros
Leonildo Correa - Faculdade de Direito -- USP -- 27/01/2008
Discurso aos combatentes

A história nos ensina que a dominação, a opressão, a exclusão e a exploração sempre foram derrotadas e destruídas. Impérios caíram. Imperadores, reis, czares e príncipes foram derrotados, decapitados e fuzilados. Ditadores e tiranos tombaram nos palácios e nos campos de batalha e com eles o sistema de opressão e tirania que criaram e alimentavam.

A história nos mostra armadas invencíveis sendo vencidas. Exércitos gigantescos perdendo batalhas. Impérios inimagináveis ruindo. Nações poderosíssimas perdendo guerras para camponeses e Mujahedins.

No futuro não há espaço para dominação, opressão, exclusão e exploração. Não há isto no futuro. E se não há, é porque foram destruídos no presente. Nós destruímos os dominadores, os opressores e os exploradores. Por isso, eles não estão lá. Eles não fazem parte do futuro. Não fazem parte do novo céu e da nova terra.

As correntes que carregamos foram colocadas, pelos opressores e dominadores, nos nossos antepassados. Eles não as colocaram em nós. Nós herdamos estas correntes de nossos antepassados e as prendemos às nossas vidas. A nossa tolerância diante do mal, a nossa aceitação e colaboração com o mal, a nossa omissão e indiferença é que estabeleceram a dominação, a opressão, a exclusão e a exploração sobre nós.

Os dominadores e opressores somente nos dominam e oprimem porque nós consentimos com a dominação e com a opressão. Somos dóceis. Somos patéticos. Somos resignados diante do mal. Nossos antepassados foram domesticados pela escravidão e nos passaram, culturalmente, a domesticação que receberam. Se não lutamos, eles vencem. Se aceitamos a exploração e não reagimos, eles dominam. Se nos calamos e resignamos, eles oprimem.

Temos que respeitar a vida e as diferenças. Contudo, não podemos respeitar o mal, a dominação, a opressão, as injustiças, as exclusões e as explorações. Quem diz que você tem que respeitar isto é seu inimigo. É uma pessoa que ganha com este sistema. Uma pessoa que está te explorando, oprimindo e dominando.

Os dominadores, opressores e exploradores devem ser destruídos, um por um. Se não quer ser destruído, então não seja um dominador, um opressor e nem um explorador. Respeite os outros, respeita as diferenças, seja justo e faça justiça.

Certamente, aderir a esta luta é uma escolha. Uma escolha entre continuar na escravidão e morrer grudado nela ou, então, morrer lutando pela liberdade, por um novo céu e uma nova terra. Morrer lutando para romper as correntes do mal.

A morte é inevitável. Todos morrem um dia. Mas você pode escolher. Pode morrer como um herói, morrer lutando contra a dominação e a exploração, ou morrer como um covarde resignado.

Devo alertá-lo, porém, que o seu tipo de morte determina o legado que você deixa para os seus descendentes. Pode ser um legado de luta e de reação contra o mal ou pode ser um legado de vergonha e de resignação. Para os seus filhos e netos, para as futuras gerações, se você aceitar o mal e não lutar contra ele, você deixa a mesma escravidão que viveu e a opressão que sofreu, deixa um mundo tão ruim, ou pior, do que quando entrou nele. Se você lutar e reagir contra o mal, lutar contra a dominação, a opressão e a tirania, você deixa um novo céu e uma nova terra, um mundo de liberdade, justiça e paz.
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Por que eles matam negros ?

Porque os negros não reagem. São dóceis e humildes. Foram domesticados pela escravidão. Adotaram a subserviência da escravidão.

No dia em que eles matarem um negro inocente e os negros fizerem um grande levante e destruírem metade da cidade, de todas as cidades, então, eles irão parar de matar negros e começar a prender e a levar para julgamento.

O mal se instala onde encontra colaboradores, omissão, indiferença e medo. O mal foge dos lugares onde encontra reação e resistência, dos lugares onde pode ser destruído. Onde existem Homens de bem que peitam o mal e dizem: "Aqui não !!!"

"O diabo é um homem com um plano. O mal verdadeiro é um conluio de homens." Exatamente o que temos hoje.

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Um aspecto é muito exaltado por Arendt nessa obra - Eichmann em Jerusalém, é a solidariedade e a capacidade de resistência à opressão – qualidades raramente encontradas naqueles tempos sombrios – mas quando elas aconteceram, os alemães recuaram.

"Quando [os nazistas] encontraram resistência baseada em princípios, sua 'dureza' se derreteu como manteiga ao sol. [...] O ideal de 'dureza', exceto talvez para uns poucos brutos semi-loucos, não passava de um mito de auto-engano, escondendo um desejo feroz de conformidade a qualquer preço, e isso foi claramente revelado nos julgamentos de Nüremberg, onde os réus se acusavam e traíam mutuamente e juravam ao mundo que sempre 'haviam sido contra aquilo', ou diziam, como faria Eichmann, que seus superiores haviam feito mau uso de suas melhores qualidades. Em Jerusalém, ele acusou 'os poderosos' de ter feito mau uso de sua 'obediência'" – ironizou Arendt.

A Holanda, lembra Arendt, foi o único país da Europa em que os estudantes entraram em greve quando professores judeus foram despedidos, e onde uma onda de greves operárias explodiu como reação à primeira deportação de judeus para os campos de concentração, principalmente de Sobibor. Na Dinamarca, quando os alemães abordaram altos funcionários governamentais para que fosse possível a identificação de judeus por um emblema amarelo no braço, eles simplesmente responderam que nesse caso o rei também usaria a identificação e que se os alemães insistissem haveria uma imediata renúncia generalizada. Segundo Arendt, os nazistas recuaram e foram tratar de criar outros meios para perpetrar seus crimes na região.

(Texto completo aqui)

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Diz Henry Thoreau em "A desobediência civil":

De fato, nenhum homem tem o dever de se dedicar à erradicação de qualquer mal, mesmo o maior dos males; ele pode muito bem ter outras preocupações que o mobilizem. Mas ele tem no mínimo a obrigação de lavar as mãos frente à questão e, no caso de não mais se ocupar dela, de não dar qualquer apoio prático à injustiça. Se me dedico a outras metas e considerações, preciso ao menos verificar se não estou fazendo isso à custa de alguém em cujos ombros esteja sentado. É preciso que eu saia de cima dele para que ele também possa estar livre para fazer as suas considerações. (...)

(...) Há milhares de pessoas cuja opinião é contrária à escravidão e à guerra; apesar disso, nada fazem de eletivo para pôr fim a ambas; dizem-se filhos de Washington e Franklin, mas ficam sentados com as mãos nos bolsos, dizendo não saber o que pode ser feito e nada fazendo; chegam a colocar a questão do livre comércio à frente da questão da liberdade, e ficam quietos lendo as cotações do dia junto com os últimos boletins militares sobre a campanha do México; é possível até que acabem por adormecer durante a leitura. Qual é hoje a cotação do dia de um homem honesto e patriota? Eles hesitam, arrependem-se e às vezes assinam petições, mas nada fazem de sério ou de eletivo. Com muito boa disposição, preferem esperar que outros remedeiem o mal, de forma que nada reste para motivar o seu arrependimento. No melhor dos casos, nada mais farão do que depositar na urna um voto insignificante, cumprimentar timidamente a atitude certa e, de passagem, desejar-lhe boa sorte. Há novecentos e noventa e nove patronos da virtude e apenas um homem virtuoso; mas é mais fácil lidar com o verdadeiro dono de algo do que com seu guardião temporário. (...)

(...) Na maior parte dos casos não há qualquer livre exercício de escolha ou de avaliação moral; ao contrário, estes homens nivelam-se à madeira, à terra e às pedras; e é bem possível que se consigam fabricar bonecos de madeira com o mesmo valor de homens desse tipo. Não são mais respeitáveis do que um espantalho ou um monte de terra. Valem tanto quanto cavalos e cachorros. No entanto, é comum que homens assim sejam apreciados como bons cidadãos. Há outros, como a maioria dos legisladores, políticos, advogados, funcionários e dirigentes, que servem ao Estado principalmente com a cabeça, e é bem provável que eles sirvam tanto ao Diabo quanto a Deus - sem intenção -, pois raramente se dispõem a fazer distinções morais. Há um número bastante reduzido que serve ao Estado também com a sua consciência; são os heróis, patriotas, mártires, reformadores e homens, que acabam por isso necessariamente resistindo, mais do que servindo; e o Estado trata-os geralmente como inimigos. Um homem sábio só será de fato útil como homem, e não se sujeitará à condição de "barro" a ser moldado para "tapar um buraco e cortar o vento”; ele preferirá deixar esse papel, na pior das hipóteses, para as suas cinzas.

(Texto completo aqui)

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Eu tenho um sonho
Discurso de Martin Luther King (28/08/1963)

"Eu estou contente em unir-me com vocês no dia que entrará para a história como a maior demonstração pela liberdade na história de nossa nação.

Cem anos atrás, um grande americano, na qual estamos sob sua simbólica sombra, assinou a Proclamação de Emancipação. Esse importante decreto veio como um grande farol de esperança para milhões de escravos negros que tinham murchados nas chamas da injustiça. Ele veio como uma alvorada para terminar a longa noite de seus cativeiros.

Mas cem anos depois, o Negro ainda não é livre. Cem anos depois, a vida do Negro ainda é tristemente inválida pelas algemas da segregação e as cadeias de discriminação. Cem anos depois, o Negro vive em uma ilha só de pobreza no meio de um vasto oceano de prosperidade material. Cem anos depois, o Negro ainda adoece nos cantos da sociedade americana e se encontram exilados em sua própria terra. Assim, nós viemos aqui hoje para dramatizar sua vergonhosa condição.

De certo modo, nós viemos à capital de nossa nação para trocar um cheque. Quando os arquitetos de nossa república escreveram as magníficas palavras da Constituição e a Declaração da Independência, eles estavam assinando uma nota promissória para a qual todo americano seria seu herdeiro. Esta nota era uma promessa que todos os homens, sim, os homens negros, como também os homens brancos, teriam garantidos os direitos inalienáveis de vida, liberdade e a busca da felicidade. Hoje é óbvio que aquela América não apresentou esta nota promissória. Em vez de honrar esta obrigação sagrada, a América deu para o povo negro um cheque sem fundo, um cheque que voltou marcado com "fundos insuficientes".

Mas nós nos recusamos a acreditar que o banco da justiça é falível. Nós nos recusamos a acreditar que há capitais insuficientes de oportunidade nesta nação. Assim nós viemos trocar este cheque, um cheque que nos dará o direito de reclamar as riquezas de liberdade e a segurança da justiça.

Nós também viemos para recordar à América dessa cruel urgência. Este não é o momento para descansar no luxo refrescante ou tomar o remédio tranqüilizante do gradualismo. Agora é o tempo para transformar em realidade as promessas de democracia. Agora é o tempo para subir do vale das trevas da segregação ao caminho iluminado pelo sol da justiça racial. Agora é o tempo para erguer nossa nação das areias movediças da injustiça racial para a pedra sólida da fraternidade. Agora é o tempo para fazer da justiça uma realidade para todos os filhos de Deus.

Seria fatal para a nação negligenciar a urgência desse momento. Este verão sufocante do legítimo descontentamento dos Negros não passará até termos um renovador outono de liberdade e igualdade. Este ano de 1963 não é um fim, mas um começo. Esses que esperam que o Negro agora estará contente, terão um violento despertar se a nação votar aos negócios de sempre.

Mas há algo que eu tenho que dizer ao meu povo que se dirige ao portal que conduz ao palácio da justiça. No processo de conquistar nosso legítimo direito, nós não devemos ser culpados de ações de injustiças. Não vamos satisfazer nossa sede de liberdade bebendo da xícara da amargura e do ódio. Nós sempre temos que conduzir nossa luta num alto nível de dignidade e disciplina. Nós não devemos permitir que nosso criativo protesto se degenere em violência física. Novamente e novamente nós temos que subir às majestosas alturas da reunião da força física com a força de alma. Nossa nova e maravilhosa combatividade mostrou à comunidade negra que não devemos ter uma desconfiança para com todas as pessoas brancas, para muitos de nossos irmãos brancos, como comprovamos pela presença deles aqui hoje, vieram entender que o destino deles é amarrado ao nosso destino. Eles vieram perceber que a liberdade deles é ligada indissoluvelmente a nossa liberdade. Nós não podemos caminhar só.

E como nós caminhamos, nós temos que fazer a promessa que nós sempre marcharemos à frente. Nós não podemos retroceder. Há esses que estão perguntando para os devotos dos direitos civis, "Quando vocês estarão satisfeitos?"

Nós nunca estaremos satisfeitos enquanto o Negro for vítima dos horrores indizíveis da brutalidade policial. Nós nunca estaremos satisfeitos enquanto nossos corpos, pesados com a fadiga da viagem, não poderem ter hospedagem nos motéis das estradas e os hotéis das cidades. Nós não estaremos satisfeitos enquanto um Negro não puder votar no Mississipi e um Negro em Nova Iorque acreditar que ele não tem motivo para votar. Não, não, nós não estamos satisfeitos e nós não estaremos satisfeitos até que a justiça e a retidão rolem abaixo como águas de uma poderosa correnteza.

Eu não esqueci que alguns de você vieram até aqui após grandes testes e sofrimentos. Alguns de você vieram recentemente de celas estreitas das prisões. Alguns de vocês vieram de áreas onde sua busca pela liberdade lhe deixaram marcas pelas tempestades das perseguições e pelos ventos de brutalidade policial. Você são o veteranos do sofrimento. Continuem trabalhando com a fé que sofrimento imerecido é redentor. Voltem para o Mississippi, voltem para o Alabama, voltem para a Carolina do Sul, voltem para a Geórgia, voltem para Louisiana, voltem para as ruas sujas e guetos de nossas cidades do norte, sabendo que de alguma maneira esta situação pode e será mudada. Não se deixe caiar no vale de desespero.

Eu digo a você hoje, meus amigos, que embora nós enfrentemos as dificuldades de hoje e amanhã. Eu ainda tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.

Eu tenho um sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado de sua crença - nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os homens são criados iguais.

Eu tenho um sonho que um dia nas colinas vermelhas da Geórgia os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos desdentes dos donos de escravos poderão se sentar junto à mesa da fraternidade.

Eu tenho um sonho que um dia, até mesmo no estado de Mississippi, um estado que transpira com o calor da injustiça, que transpira com o calor de opressão, será transformado em um oásis de liberdade e justiça.

Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter. Eu tenho um sonho hoje!

Eu tenho um sonho que um dia, no Alabama, com seus racistas malignos, com seu governador que tem os lábios gotejando palavras de intervenção e negação; nesse justo dia no Alabama meninos negros e meninas negras poderão unir as mãos com meninos brancos e meninas brancas como irmãs e irmãos. Eu tenho um sonho hoje!

Eu tenho um sonho que um dia todo vale será exaltado, e todas as colinas e montanhas virão abaixo, os lugares ásperos serão aplainados e os lugares tortuosos serão endireitados e a glória do Senhor será revelada e toda a carne estará junta.

Esta é nossa esperança. Esta é a fé com que regressarei para o Sul. Com esta fé nós poderemos cortar da montanha do desespero uma pedra de esperança. Com esta fé nós poderemos transformar as discórdias estridentes de nossa nação em uma bela sinfonia de fraternidade. Com esta fé nós poderemos trabalhar juntos, rezar juntos, lutar juntos, para ir encarcerar juntos, defender liberdade juntos, e quem sabe nós seremos um dia livre. Este será o dia, este será o dia quando todas as crianças de Deus poderão cantar com um novo significado.

"Meu país, doce terra de liberdade, eu te canto.

Terra onde meus pais morreram, terra do orgulho dos peregrinos,

De qualquer lado da montanha, ouço o sino da liberdade!"

E se a América é uma grande nação, isto tem que se tornar verdadeiro.

E assim ouvirei o sino da liberdade no extraordinário topo da montanha de New Hampshire.

Ouvirei o sino da liberdade nas poderosas montanhas poderosas de Nova York.

Ouvirei o sino da liberdade nos engrandecidos Alleghenies da Pennsylvania.

Ouvirei o sino da liberdade nas montanhas cobertas de neve Rockies do Colorado.

Ouvirei o sino da liberdade nas ladeiras curvas da Califórnia.

Mas não é só isso. Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Pedra da Geórgia.

Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Vigilância do Tennessee.

Ouvirei o sino da liberdade em todas as colinas do Mississipi.

Em todas as montanhas, ouviu o sino da liberdade.

E quando isto acontecer, quando nós permitimos o sino da liberdade soar, quando nós deixarmos ele soar em toda moradia e todo vilarejo, em todo estado e em toda cidade, nós poderemos acelerar aquele dia quando todas as crianças de Deus, homens pretos e homens brancos, judeus e gentios, protestantes e católicos, poderão unir mãos e cantar nas palavras do velho spiritual negro:

"Livre afinal, livre afinal.

Agradeço ao Deus todo-poderoso, nós somos livres afinal."
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O miolo da questão

A escravidão gerou uma elite, uma minoria branca, econômica poderosa que controla e domina tudo. Uma minoria que continua disseminando e usando os costumes da escravidão, pois a riqueza que eles possuem veio da escravidão, seja do trabalho escravo, seja do comércio de escravos.

Uma minoria que, atualmente, escraviza tanto os negros, que são pobres pela escravidão histórica, quanto os brancos que nascem pobres pela exclusão econômica atual.

Uma minoria que domina a política, a burocracia, a economia, enfim, todos níveis do Estado. E não deixa que mudanças essenciais aconteçam. Eles fazem as leis, eles governam, eles aplicam as leis, eles são os juízes, etc, Estão no poder e querem se perpetuar no poder.

Portanto, a questão do racismo é completamente irrelevante, principalmente porque raça não existe. E se existir só há uma: a raça humana. O miolo da questão é a dominação, a opressão, a exclusão e a exploração imposta por uma minoria branca rica sobre uma maioria negra e pobre.

Inclusive o Professor e ex-governador Cláudio Lembro (Site e textos aqui) é uma pessoa de grande visão, entendimento e sabedoria. Mas, mais do que isto, ele tem que coragem de falar a verdade. Não adianta ter grande entendimento e sabedoria e ficar calado ou colaborar com o mal. É preciso falar e falar na lata.

Disse o professor Lembo: "A elite branca deveria olhar menos para o que acontece no exterior e mais para a realidade social do Brasil".

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Palavras do Professor e ex-governador Cláudio lembro:
SOBRE A ELITE BRASILEIRA

"O Brasil é um país que só conheceu derrotas. Derrotas sociais... Nós temos uma burguesia muito má, uma minoria branca muito perversa".

"Em suas lindas casas dizem que vão sair às ruas fazendo protesto. Vão fazer protesto nada! Vão é para o melhor restaurante cinco estrelas com outras figuras da política nacional fazer o bom jantar".

"Nossa burguesia devia é ficar quietinha e pensar muito no que ela fez para esse País".

"A Casa-grande tinha tudo e a Senzala não tinha nada. Então é um drama. É um País que quando os escravos foram libertados, quem recebeu indenização foi o Senhor e não os libertos, como nos EUA. Então, é um País único. (...) O cinismo nacional mata o Brasil. Esse País tem que deixar de ser cínico. Vou falar a verdade, doa a a quem doer, destrua a quem destruir, por que acho que só a verdade vai construir este País".

SOBRE A REAÇÂO DA ELITE PAULISTANA

"O que eu vi em entrevistas da Folha de S. Paulo foram dondocas dizendo coisinhas lindas. Todos são bonzinhos publicamente. E depois exploram a sociedade, seus serviçais, exploram todos os serviços públicos. Querem estar sempre nos palácios dos governos porque querem ter benesses do governo. Isso não vai ter aqui nesses oito meses".

SOBRE A ELITE BRASILEIRA

"A bolsa da burguesia terá de ser aberta, para sustentar a miséria, no sentido de haver mais empregos, mais educação, mais solidariedade, mais diálogo e reciprocidade de situações".

"Se nós não mudarmos a mentalidade brasileira, o cerne da minoria branca brasileira, não iremos a lugar algum".

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O exército de crime
Roberto Saturnino Braga -- JORNAL – CORREIO BRAZILIENSE – 25.05.2006 – PÁG.29
Senador PT/RJ, é presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado

Arrefecida a tensão da tragédia de São Paulo, discutem-se intensamente muitos subitens do problema da violência urbana – o uso de celulares nos presídios, as benevolências carcerárias existentes, o agravamento supostamente necessário das penas –, mas ignora-se o fato principal: que o crime organizado dispõe de um exército com grande poder de fogo, comandado por chefes de dentro dos presídios ou por outros que logo os substituem quando eles faltam. O gravíssimo é que existe esse exército organizado capaz de fazer frente à polícia de igual para igual, cessando fogo mediante negociação entre poderes. Isso sem falar do outro exército, também numeroso mas inorgânico, de assaltantes maiores e menores que enchem as ruas das cidades.

Que fenômeno é esse? Que enorme bando é esse de brasileiros que ignoram a lei, o Estado, a República, os valores da moral, da justiça, da humanidade? Como e por que se formou essa legião de bárbaros dentro da sociedade? Como reverter a formação? E como tornar mais eficaz, a curto prazo, nossa polícia para enfrentá-los? Essas são as questões principais que, antes de todas, precisam encontrar resposta.

Houve falta de investimento em educação nas décadas passadas? Evidentemente houve, a constatação é consensual. Houve falta de emprego, falta de oportunidade para uma vida digna? Sim, é outro consenso. Cresceu a massa de pobreza absoluta? Desagregou-se a família, a religião? Sim, também. Esses são fatores efetivamente importantes na formação daquelas legiões. Mas que ainda não explicam tudo a meu juízo. Há que somar outras causas para se ter um efeito tão grande e assustador. Penso, principalmente, no enorme, vasto e profundo sentimento de injustiça que cresceu na alma do nosso povo mais carente e vitimado nos últimos 20 anos. Esse sentimento de injustiça gera ódio nos corações mais agressivos e gera cinismo absoluto, insensibilidade nos mais fracos de caráter. E esse sentimento do povo carente é gerado pela injustiça estrutural e abissal da nossa sociedade e no cinismo com que a nossa “elite branca perversa” (Cláudio Lembo) a encara, achando que é natural, resultante das diferenças de competência e de disposição para o trabalho, decorrente da falta de “competitividade” deles no mercado – os trabalhadores mais pobres – e o mercado tem que ser acatado, ele é que decide, é a racionalidade, não há nada a fazer.

Pois o mercado não decide nada; quem decide é precisamente esse sindicato do cinismo que manda na economia brasileira; eles decidem que é o mercado quem deve decidir, e o povo que se vire. A sociedade, porém, pode decidir, politicamente, que os critérios de distribuição dos frutos do trabalho não são apenas os do mercado e da “competição”, mas também os da justiça, os da solidariedade, os do congraçamento social. Critérios, estes outros, que devem ser implementados pelo Estado, pela sua presença na economia e pelo planejamento, que a elite cínica quer evitar a todo custo, e conseguiu fazê-lo nas décadas perdidas do neoliberalismo.

É claro que esse novo paradigma é viável; trata-se de um confronto político que está acontecendo no país. Se a elite endinheirada e cínica não bota a mão no bolso para ajudar os mais carentes (Cláudio Lembo), o Estado tem de meter a mão no bolso dela, legitimamente, taxando fortunas e ganhos de capital e pagando juros baixos, para investir muito mais na educação, sim, mas também nas favelas, na habitação digna, no saneamento.

Mudar o modelo, eis aí. Encerrar a era neoliberal. É muito difícil, todos sabemos, enfrentar os gigantescos interesses do capital. Mas temos que tentar; junto com a América do Sul, para ficar menos difícil. Dialogando com a França também, que é o único país rico a manifestar resistência àqueles interesses. Enfim, é o principal que temos de fazer, pensando num Brasil mais justo e menos violento.

Mas é evidente que temos que cuidar, de imediato, da eficácia da polícia. Temos que aumentar seus efetivos, que são muito baixos (algo como cinco vezes menos policiais em ação por 1.000 habitantes que nos países ricos). Temos que preparar ainda melhor esses efetivos, como tem feito a Força Nacional; temos que usar mais as tecnologias avançadas, a do geoprocessamento, por exemplo, que permite monitorar todas as ruas da cidade 24 horas por dia. Não entro a fundo nessa discussão porque não sou do ramo, mas é claro que ela é importantíssima – e, a curto prazo, todos dependemos dela.

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Precisamos fazer um rastreamento histórico
Poderíamos fazer um rastreamento histórico para calcular a quantidade, aproximada, de riquezas que os negros produziram, ao longo de centenas de anos de escravidão, e que foi apropriada pelos brancos.

Poderíamos fazer um rastreamento para descobrir onde está esta riquezas, onde estão as famílias que adquiriram e usaram escravos, o que fizeram com a riqueza que acumularam, no que investiram.

Precisamos ver, com exatidão, a partir de que momento os negros, antigos escravos, começaram a estudar... E onde se estabeleceram.

Também temos que ver em que momento os negros começaram a adquirir propriedades, principalmente, terras e de que forma. Eles eram ex-escravos e descendentes de escravos, como conseguiram arranjar recursos para isto ?

Além disso, é preciso ver, após a escravidão, como ficou a questão das terras. Os brancos, pelo que consta, já tinham se apoderado de tudo, restando apenas as terras distantes e inóspitas...

As respostas destas questões mostrarão, exatamente, porque os negros são pobres, porque são analfabetos e porque vivem nas favelas e periferias.

A resposta, certamente, pode ser antecipada: dominação, opressão, exclusão e exploração dos brancos contra os negros.

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Branco não é raça. É cor.
Na discussão da dominação, opressão, exclusão e exploração de uma minoria branca sobre a maioria negra e de pobres, estão tentando levar o tema para o lado do racismo. Racismo ??? Que tipo de racismo ? Não estamos diante de uma questão de raça, a coisa é muito pior e muito maior, estamos diante de uma questão de cor. Cor não se confunde com raça...

Os brancos não se fundem em uma única raça, assim como os negros não são uma única raça. Mais do que isto, existem brancos que são tão explorados, pelos próprios brancos, quanto os negros. Portanto, não há, nesta questão, a discussão de racismo. Inclusive, no Brasil, não é possível discutir racismo, pois aqui todo mundo é vira-lata.

Certamente, vão tentar deslocar a discussão para o tema do racismo. Vão fazer isto para emperrar o negócio e não resolver nada. Vão dizer que a insurgência dos negros contra os brancos é racismo. Vão dizer que os brancos, uma minoria, pode dominar, explorar, oprimir e excluir a maioria da população. Isto é mérito.

Contudo, em um passado próximo, os negros eram escravizados. Tudo o que produziram agregou-se ao patrimônio dos brancos. E o costume da escravidão, assim como a cultura de ver os negros como bobos, serviçais, analfabetos, inferiores, etc, entrou e se perpetuou na sociedade. A identificação está na cor e não em raça.

Um branco nascido na África, que só falava dialetos africanos, adotava todos os costumes africanos, etc, poderia ser escravizado ? A escravidão pode ter começado com uma raça, mas, ao longo do tempo, foi nivelada por um só critério: a cor. E hoje a dominação branca continua se respaldando no mesmo critério, na cor. Os maiores bandidos são brancos. Mas quem vai para a cadeia são os negros.

Se os negros tivessem escravizado os brancos e arrancado tudo o que eles produziram, ao longo de centenas de anos, hoje, estaríamos falando da dominação dos negros sobre os brancos. Os brancos seriam os pobres, os favelados, os analfabetos, os inferiores, etc. A superioridade e a riqueza dos brancos foi construída com o sangue dos negros, com o trabalho dos negros, com o rebaixamento dos negros, com a submissão dos negros, com o holocausto dos negros.

Mas vamos pegar um exemplo pragmático. Eu gosto de pragmatismo. Hoje, se você chegar em um rico tradicional (Forest Gump), não os novos ricos da megasena, ele vai te contar. O meu dodecavô não tinha nada começou do zero. E deixou uma moeda para o meu udecavô. Com uma moeda o meu udecavô comprou uma galinha e deixou de herança para o meu decavô. O meu decavô trabalhou, ganhou outra moeda e comprou um galo. Deixou um galo e uma galinha de herança para o meu nonavô. O meu nonavô com a galinha e o galo poduziu ovos e construiu um galinheiro, deixando tudo de herança para o meu octavô. O meu octavô com a galinha, o galo, o galinheiro e os ovos, aumentou a produção e construiu cinco galinheiros, deixando tudo de herança para o meu septavô. O meu septavô juntou tudo, aumentou a produção, e construiu uma granja e deixou de herança para o meu hexavô. O meu hexavô ampliou o negócio, construiu mais granjas e comprou uma fazenda e deixou para o meu pentavô.

O meu pentavô com estes bens montou uma indústria de ovos e iniciou a engorda e o abate de frangos. Já o meu tetravô não gostava de aves e preferiu começar outro negócio. Ele investiu em cimento. Ampliando os negócios da Família. O meu trisavô não gostava nem de aves e nem de cimento, mas de alumínio. Então ele investiu na montagem de uma fábrica de alumínio. O meu bisavô continuou com o negócio das aves e do gado, investindo pesado na exportação. Coisa que o meu avô não fez, pois gostava mais de tecnologia. Ele investiu pesado em empresas de internet. E meu pai e eu gostamos mais de mercado financeiro. Investimos o dinheiro da família no mercado, mas até hoje ainda temos o galo e a galinha adquiridos pelo meu udecavô e meu decavô, ainda continuam botando ovos. Dizem que esse galo e esta galinha vieram das terras altas, vieram da Escócia. São Highlander.

Agora vamos ver a História dos negros. Dodecavô: escravo. Udecavô: escravo. Decavô: escravo. Nonavô: escravo no galinheiro. Octavô: escravo em 5 galinheiros. Septavô: escravo na granja. Hexavô: escravo na fazenda. Pentavô: escravo na fazenda. Tetravô: escravo na fazenda. Trisavô: escravo na fazenda. Bisavô: livre - trabalhador rural sem-terra. Avô: livre - servente de pedreiro...

Aquilo que a força do trabalho dos negros produziu, ao longo de centenas de anos, foi agregado ao patrimônio dos brancos. Quando a escravidão terminou, os negros foram expulsos das senzalas com uma mão na frente e outra atrás. A única coisa que possuíam era a força de trabalho. A força de trabalho que vendem até hoje. Os negros são pobres, são favelados, são analfabetos, etc, por causa da escravidão dos brancos que os impediu de se desenvolveram, de acessarem as riquezas, de estudarem, de usufruírem daquilo que produziram. Não só impediu, como continuam impedindo.

A dominação dos negros pelos brancos não é uma questão de raça, é uma questão de uma minoria oprimindo, excluindo e explorando uma maioria. Não há embasamento para se falar em raça no Brasil. A dominação está mais baseada na cor, por uma razão histórica, do que na idéia de raça que envolve costumes, língua, religião, etc...

A discussão fundamental é o domínio de uma minoria sobre uma grande maioria. Uma minoria que controla o poder político, o poder econômico e as instituições públicas, impedindo a maioria da população (negros e pobres) de acessarem o poder político, o poder econômico e as instituições públicas. Uma minoria que, para perpetuar a sua dominação, impede a realização de projetos sociais que o apartheid social. O parasita cria mecanismos para perpetuar o parasitismo.

A reparação histórica é mais do que obrigação. É justiça, pois a riqueza que construíram originou-se da escravidão.
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Somente haverá paz, contínua e duradoura, quando houver justiça e for eliminada toda forma de dominação, opressão, exclusão e exploração. Enquanto existir isto, haverá desejo de vingança e pessoas dispostas a iniciar uma guerra para fazer cessar o mal.

O terrorismo é conseqüência da dominação, opressão, exclusão e exploração. O terrorismo não é causa é conseqüência. Além disso, é um meio de luta como judô, karatê, kung fu. Portanto, não se combate o terrorismo, a conseqüência, sem combater as causas. Eliminou as causas, eliminou a conseqüência, eliminou o terrorismo.

Entre a causa e a conseqüência há uma linha do tempo. Uma linha que leva à ação terrorista. Se olharmos para esta linha veremos crianças jogando pedras em tanques, jovens provocando soldados, o ódio se expandido. E o resultado, terrorismo. Contudo, eu pergunto, quanto a guerra ao terror rendeu para as indústrias que fabricam armas e equipamentos anti-terror ? Por isso, as causas não são combatidas...

O capitalismo, dentro da sociedade humana, é um touro desajeitado que entrou em uma loja de cristal e porcelanas. Não há como tirá-lo. Logo, temos que segurá-lo, controlá-lo e amarrá-lo, etc... Mesmo assim, ele vai fazer um grande estrago. Acho que esta história vai acabar em churrasco dentro da loja. Vamos comer o capitalismo...
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Está chegando a hora de deixar a Universidade e ir para as favelas, para as periferias, para o meio da coletividade. Minha sina não será diferente da sina do meu povo. (Filme: Star Wars I - Ameaça Fantasma). Contudo, antes disso preciso construir e fundamentar a parte espiritual da revolução. É a parte espiritual que leva um homem a lutar e a oferecer a própria vida para o bem de todos, para salvar as futuras gerações. É a parte espiritual que faz um homem amarrar bombas ao próprio corpo e explodir com o inimigo.

Certamente, eu não pretendo construir um fundamento espiritual tão radical e extremo. Mas devo construí-lo de forma que a luta dure enquanto durar a dominação, a opressão, a exploração e as injustiças. Enquanto a igualdade de direitos e condições não forem alcançadas e uma minoria estiver oprimindo a maioria, a luta tem que durar.

Além disso, o fundamento espiritual tira a importância das lideranças e das pessoas e põe o motivo na realidade. Não lutam pelo Leonildo, ou por fulano ou por sicrano. Lutam porque há uma dominação, uma opressão, a exploração e a escravidão sobre todos. Lutam por si mesmos, por suas consciências, por suas liberdades e para que as próximas gerações nasçam livres e em uma sociedade fundada na justiça, no direito e na vontade da maioria.

Eu não sou importante. A minha pessoa não é importante. Essenciais e necessárias são as minhas idéias e visões. Elas é que mostrarão o rumo e que motivarão a luta, seja por um, dois ou dez mil anos. A vida é passageira. A consciência e as idéias são eternas. Por isso, o que fazemos em vida ecoa na eternidade.
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"Lembre-se, lembre-se, do dia 5 de novembro. A pólvora, a traição e a conspiração. Não vejo razão para que a pólvora da traição jamais seja esquecida.

Mas e o homem ? Sei que se chamava Guy Fawkes. E sei que em 1605 ele tentou explodir as casas do Parlamento. Mas quem ele era na realidade ? Como era ?

Lembramos da idéia totalmente, mas não do homem. Pois um homem pode fracassar. Podem capturá-lo, matá-lo e esquecê-lo. Mas uma idéia, quatrocentos anos depois, ainda pode mudar o mundo.

Presenciei pessoalmente o poder das idéias. Vi pessoas serem mortas em seu nome...e morrerem defendendo-as.

Mas uma idéia não pode ser beijada, tocada ou abraçada. Idéias não sangram, sentem dor, ou amam." (Abertura do Filme V de Vingança)
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Por trás deste movimento deve haver mais do que pele e osso. Tem que haver idéias. Idéias são a prova de bala. Passam de pessoa para pessoa, de geração para geração, contaminando toda a sociedade. Pode-se matar uma pessoa, mas não se pode matar uma idéia, um propósito, um destino.

"Há mais de cem anos, o poeta alemão Heine advertiu os franceses a não subestimarem o poder das idéias: os conceitos filosóficos alimentados na tranqüilidade do gabinete de um professor poderiam destruir uma civilização. Citou ele a Crítica da Razão Pura, de Kant, como a espada com que fora decapitado o teísmo europeu, e descreveu as obras de Rousseau como a arma ensangüentada que, em mãos de Robespierre, destruíra o antigo regime." (Isaiah Berlin -- Quatro Ensaios sobre a Liberdade).
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V, no filme V de Vingança, não quer meramente um acerto de contas pessoal. Verdade que ele não esquece e nem perdoa os horrores que viu e sentiu durante os primeiros anos de instalação do regime que agora surge para combater, com direito a experiências genéticas em campos de concentração que não deixavam nada a dever às dos nazistas em sua melhor forma. Mas, se fosse apenas isso, bastaria a ele eliminar os responsáveis pelo seu sofrimento (o que ele, efetivamente, faz — metódica e eficientemente, aliás).

Mas a cruzada de V não se restringe a pessoas. Sua amplitude é muito maior: ele quer matar todo um regime político. Não se conforma com a realidade que o cerca. Não se submete — e não admite que as outras pessoas se submetam. Quer abrir os olhos de seus concidadãos para o fato de que a realidade em que vivem não é a única possível.

Quer mostrar que o povo não deve temer um governo, mas todo governo deve temer o povo. Quer esquartejar a ideologia dos que detêm o poder. Sua vingança, portanto, transcende o mero gosto pelo sangue de seus algozes. E o fato de ele poder unir as duas coisas em sua cruzada, já que seus algozes são todos membros do próprio sistema que ele quer ver eliminado, é apenas uma feliz coincidência.

Ele quer erguer toneladas de poeira, resultado da explosão de tudo o que for um símbolo do poder instituído. Busca, acima de tudo, eliminar um governo por suas próprias mãos. Nenhum passo de V é dado por acaso: ele se preparou durante anos a fio, em várias frentes, matando quem o torturou sem deixar pistas, minando pouco a pouco toda a estrutura do estado policial que o cerca sem ser jamais pressentido, a não ser quando ele mesmo decide que é hora de subir ao palco.
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Eu navego facilmente, tanto no mundo das idéias, quanto no mundo da ação. Inclusive posso criar pontes diretas entre estes dois mundos. Isto significa que eu já tenho os planos que precisamos para a resistência e para a rebelião. Agora é preciso encontrar pessoas leais, comprometidas e dispostas a enfrentarem a dominação e a opressão do sistema. Preciso encontrar Cavaleiros Jedi naturais que lutem pela Justiça, contra a tirania e contra o império dos grupos dominantes. Pessoas que queiram instalar a verdadeira República no Brasil, assim como restaurar a essência da antiga polis grega. Uma República livre da dominação dos grupos econômicos e dos corruptos. Uma República na qual o povo expresse livremente a sua vontade.

Eu estou pronto para iniciar o movimento e para enfrentar o mal em todos os níveis. Sou leal ao movimento e aos companheiros que entrarem na luta. Não deixaremos ninguém para trás. E aqueles que tombarem ao longo do caminho, como disse Getúlio, "sairão da Vida para entrar na História". Os negros podem iniciar algo novo. Algo que os brancos não podem iniciar, pois estão presos à dominação e corrompidos pelo poder.
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O problema dos pardos se resolve da seguinte forma: pardo pobre é negro; pardo rico é branco. Isto não está sendo imposto, mas proposto. A última palavra no assinto será dado pela consciência de cada um.
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A Câmara e o Senado são brancos, pois os políticos são todos brancos. Logo, a lei que produzem também é branca e representa o que eles pensam, a dominação que eles exercem, a opressão que executam, a exploração que os enriquecem.

A burocracia, a administração pública brasileira, assim como o poder executivo é branco, pois somente são aprovados nos concursos os brancos que dominam as melhores Universidades Públicas ou possuem recursos para pagar os cursinhos caríssimos.

A justiça brasileira é branca. O judiciário brasileiro é branco, pois os juízes brasileiros são brancos. Esta é uma das razões das prisões brasileiras estarem cheias de negros.

A polícia brasileira é branca, pois a maioria dos policiais são brancos. Esta é outra razão dos negros serem as maiores vítimas da polícia, principalmente, nas favelas. O mesmo se aplica aos oficiais graúdos das forças armadas.

Portanto, no Brasil, o executivo, o legislativo e o judiciário são brancos. A força de repressão também é branca. E a maioria da população é negra.

Isto me lembra Esparta na Grécia Antiga. Contudo, Esparta era uma cidade-estado militar. Esta era a única forma de manterem a opressão de uma minoria sobre uma maioria. De acordo com a Wikipedia, "os Hilotas eram os servos, que pertencendo ao estado espartano, trabalhavam nos kleros(lotes de terra), entregando metade das colheitas ao Espartano e eram duramente explorados. Deviam cultivar essa terra a vida inteira e não podiam ser expulsos de seu lugar. Levavam uma vida muito dura, sujeita a humilhações constantes. Foram protagonistas de várias revoltas contra o estado espartano. Para controlar as revoltas e manter os hilotas sob clima de terror, os espartanos organizavam expedições anuais de extermínio (krypteia ou criptias), onde os hilotas eram obrigados a participar. Tratava-se de um massacre anual que consistia na perseguição e morte dos hilotas considerados perigosos, no qual os espartanos competiam para ver quem matava mais hilotas. "(clique aqui para ler o verbete: Esparta)

E no Brasil, como uma minoria branca consegue manter uma violenta dominação e opressão sobre uma grande maioria negra ? A resposta está no conformismo, na resignação. A maioria negra foi domesticada pela escravidão e está passando o costume da resignação, culturalmente, para as gerações seguintes. A maioria negra é uma maioria silenciosa e conformada. Precisamos quebrar essa cadeia de dominação e opressão e interromper a passagem do costume da escravidão.

É hora de organizar e realizar uma grande rebelião. É hora de fazer valer o princípio democrático e a Constituição Federal que diz: o poder pertence a maioria. Os negros são a maioria.
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Eu não sou o criador da divisão brancos x negros. Eu apenas estou evidenciando uma divisão que foi criada pela escravidão e internalizada na História do Brasil e nas instituições brasileiras. É uma divisão artificial que se tornou costume, virou paradigma e fundamenta, atualmente, a dominação e a opressão.

Os brancos enriqueceram com o sangue dos negros. Não só enriqueceram como se apoderaram de todas as riquezas do Brasil.

Os negros não são pobres porque são preguiçosos ou porque são menos inteligentes. São pobres, miseráveis e analfabetos porque foram escravizados e tudo o que produziram, por centenas de anos, foi agregado ao patrimônio dos brancos e dos europeus. A fortuna dos brancos e dos países ricos é fruto de pirataria, de furto e roubo dos negros, da escravidão dos negros, seja aqui ou seja na África.

Os negros brasileiros são pobres, miseráveis e analfabetos por isto. Porque foram escravizados e porque os brancos se apoderaram de todas as riquezas do Brasil, de todas as terras, enfim, de tudo. Quando libertaram os escravos não lhes deram nada, simplesmente os expulsaram das fazendas com uma mão na frente e outra atrás.

Se os negros tivessem escravizado os brancos e tivessem se apoderado de todas as riquezas do Brasil, hoje estaríamos falando de dominação e opressão dos negros sobre os brancos.

Portanto, a dominação e a opressão que está fundada na cor, tem que ser quebrada pela cor. Chegou a hora dos brancos responderem pelos crimes que cometeram e devolverem a riqueza que roubaram ou construíram com o sangue e o trabalho dos negros.
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Em cada Favela construiremos uma Palmares. E cada negro será um Zumbi dos Palmares em ação. Agiremos em conjunto e buscando o mesmo objetivo: destruir o poder e as instituições que nos domina, oprime e escraviza há 500 anos. Derrubaremos os grupos dominantes opressores e seus aliados e em seu lugar reconstruiremos a polis ateniense - a Democracia Direta.

Portanto, se nas revoluções o grande problema era saber o que fazer depois de tomar o poder, aqui já temos a resposta: o poder pertence à maioria e será exercido pela maioria, sem intermediários, sem representações. Porém, continuará existindo um executivo e um judiciário, pois são poderes que não podem ser manejados pela multidão. Contudo, os membros desses poderes serão eleitos e poderão ser destituídos a qualquer momento pela maioria. As leis e todos os atos de grande relevância pública serão aprovados ou rejeitados diretamente pelos cidadãos.

A democracia representativa é a democracia dos grupos dominantes, é parcial, tendenciosa e corrupta. Não representa a maioria e nem representa a vontade popular, mas sim os interesses e a vontade da classe dominante. A democracia direta é legítima, pois representa os interesses e a vontade da maioria. A vontade da maioria é o interesse público e deve ser seguida.

A violência não gera poder. Mas a violência pode destruí-lo. Por isso, na luta contra o poder que domina e oprime, a violência é uma ferramenta necessária.

A minha preocupação era construir instituições para um novo céu e uma nova terra. Contudo, somente haverá um novo céu e uma nova terra quando o velho céu e a velha terra forem limpos da dominação, da opressão e da maldade. Nós nos acostumamos ao mal que está do nosso lado. Nós toleramos e colaboramos com aquilo que temos que destruir. O mal tem que ser destruído.

1- Um Juiz branco não tem competência e nem poder suficiente para impedir os negros de entrarem nas Universidades Públicas;

2- As Universidades Públicas não pertencem aos reitores brancos ou aos grupos dominantes brancos.

3- O Estado, a Administração Pública, enfim, a burocracia, incluindo a Polícia e os Militares, estão nas mãos dos brancos. Por isso, as coisas não mudam. Por isso, massacram os negros.

4- As leis são feitas por deputados e senadores brancos, são executadas por governantes brancos e fiscalizadas por um judiciário branco. A escravidão nunca terminou. São 500 anos de escravidão, exploração e opressão dos verdadeiros brasileiros.

5- A maioria, os verdadeiros brasileiros, que construíram este país com suor e sangue, são negros. A maioria é negra, é pobre e vive na periferia. Os ricos, a elite, os grupos dominantes são brancos.

6- De onde virá as mudanças que Você espera ? Dos brancos ? Você acha que a mão que escraviza e explora vai te libertar ? Quantos negros os brancos mataram nestes 500 anos ? E se não agirmos, quantos eles irão matar no futuro ?

E não se enganem, a mídia dominante pertence aos brancos e terá que ser destruída com eles, principalmente, porque a Democracia Direta não funciona onde a mídia quer dominar e constrói as notícias que necessita para defender os seus interesses.

7- São necessários apenas 40 dias. Em 40 dias levamos à decretação de estado de sítio. Em 40 dias paralisamos todas as instituições públicas e capturamos mais da metade das autoridades públicas que apunhalam os negros pelas costas. O que faremos com eles ? Usamos como escudos para as bombas que os militares irão jogar nas periferias.

O poder que domina e oprime é branco. Os líderes negros precisam enxergar o mal que está dizimando a coletividade. O povo negro está sendo dizimado nas favelas e nas periferias. Favelas e periferias que devem ser transformadas em focos de resistência. A resistência tem que ser armada. Novos Zumbi precisam se levantar. Os negros devem se preparar para guerra. É melhor morrer lutando numa guerra pela liberdade, por justiça e igualdade de direitos, uma guerra para tomar de volta aquilo que lhe pertence, do que ser morto pelas costas, pela polícia branca, na porta de um barraco da favela, na porta daquilo que lhe impuseram como casa.

FAÇA JUSTIÇA, MESMO QUE O CÉU DESABE.

Nós somos a esperança.

domingo, 3 de fevereiro de 2008

O anticristo está entre nós, sempre esteve
Antes de escrever este texto, eu deveria consultar algumas fontes. Deveria consultar os livros sagrados mais antigos e ver qual palavra, ou termo, foi utilizado para "anticristo". Mas como isto não é possível, vou escrever aquilo que está na minha consciência da forma como veio.

O anticristo está entre nós. Sempre esteve. Porém, a nossa cegueira espiritual não permite que o vejamos. Nós estamos considerando que o anticristo é uma pessoa. Um doido qualquer que sai por aí dizendo: "Eu sou o Cristo verdadeiro, etc..." Não só dizendo, mas fazendo milagres e maravilhas. Mas não é.

O anticristo não é um homem só. São muitos homens. E ele não está só. Está acompanhado de muitos falsos profetas. Estamos cercados por eles, completamente cercados. Todo mundo olha para ele. Todo mundo olha maravilhado e se prosta diante dos seus milagres. Jesus perto do anticristo é um perna de pau jogando bola com o Ronaldinho Gaúcho. Leva cada chapéu que nem lhe conto... Ele está bem na nossa frente. E diz claramente que é o anticristo e nós não prestamos atenção nisso. Ele tenta nos convencer que Cristo, Deus, etc, não existe. E faz isto escancaradamente e abertamente... E nós não vemos o anticristo.

Há uma frase que diz: "a maior vitória do Diabo foi convencer o mundo de que ele não existia". Eu aplicaria esta frase ao "anticristo" dizendo: "A maior vitória do anticristo foi convencer o mundo de que Deus não existe". Além disso, eu não falaria em anticristo, eu falaria em antiDeus.

Quem é o anticristo ? A Ciência materialista. A Ciência materialista é o anticristo. Olhem para a Ciência, o que ela prega ? Ela e seus falsos profetas pregam abertamente que Deus não existe. E que eles podem fazer tudo o que Deus, Jesus Cristo fez. Não só podem fazer o Deus fez, como podem fazer melhor. E estão fazendo. Jesus curou o cego. Quantos cegos a Ciência curou ? Jesus fez paralítico andar... Quantos paralíticos a Ciência faz andar ?

Não a Ciência como técnica pura, inanimada, ou exercida por pessoas tementes a Deus. Mas a Ciência como instituição exercida por pessoas materialistas que querem destruir as religiões e Deus. A Ciência não é uma só pessoa. São muitas pessoas. E a Ciência Materialista é o anticristo na Terra.

A Ciência quer substituir Deus imitando tudo o que ele faz. Inclusive, vão ressuscitar os mortos. Já li uma matéria em um jonal dizendo que os Cientistas haviam ressuscitado ratos. (Notícia aqui) É um começo. Se podem ressuscitar ratos, logo poderão ressuscitar pessoas. E a clonagem ? A Ciência pode recriar a vida de um modo diferente de Deus, dizem eles. A Ciência pode construir um homem usando uma célula do pé.

Estávamos esperando um antiristo homem, uma pessoa. Mas não é uma pessoa. É uma instituição que se opõem, abertamente, a Deus e à fé. Não é só um anticristo. É um antiDeus. Não é inimigo só do cristianismo. É inimigo de todas as religiões. Como esperávamos uma pessoa, não prestamos atenção naquilo que a instituição Ciência Materialista diz e faz ao nosso redor. Entraram na nossa casa, cooptaram as nossas famílias e os nossos filhos. E nós nos rendemos aos milagres e às maravilhas que a Ciência faz. Faz cego enxergar, paralítico andar, surdo ouvir, cura doenças, etc. E, muitas vezes, deixamos Deus de lado para ouvir um cientista especialista. O pó do cientista faz mais efeito...

Não só isto, os cientistas ateus vão mais longe. Apagam as evidências de Deus que surgem nas Teorias e nos laboratórios. Chamam de método científico. Deveriam chamar de método para assassinar Deus. A razão é simples, se a Ciência é a base de tudo e a Ciência nega Deus, a divindade deixa de existir, é completamente suprimida, enterrada e esquecida. Logo, o anticristo vence. Vence pela falta de fé... Vence pela incredulidade... O pó da Ciência faz mais efeito do que a oração.

E as profecias ? Todo mundo olha para as profecias e pensam: "Conversas... Conversas para boi dormir". Eu não me surpreenderia nem um pouco se, de repente, descobríssemos que tem gente apagando as evidências de cumprimento das profecias. As profecias são um método eficaz para confirmar a existência de Deus. Se desacreditarem as profecias, tornando-as meras histórias para contar, reduzem drasticamente o poder de Deus sobre os homens e sobre a Terra. Logo, mais uma vitória da Ciência. Mais uma vitória do antiDeus.

Números... Quem é que adora números ? E transforma tudo em números, gráficos e estatísticas ? Inegavelmente, a Ciência e seu método científico. Logo, tudo indica que o tal 666 será encontrado em algum lugar na Ciência. E o número na testa ou na mão será um número de controle de alguma experiência científica, teste de vacina ou de contaminação. Somente pode comprar ou vender quem for vacinado, ou não foi contaminado. E só saberemos isto se a pessoa tiver um chip com um número implantado em alguma parte do corpo...

Além disso, através desse número liga-se o anticristo com a compra e venda. Uma ligação perfeita entre a Ciência Materialista e a Economia (outra coisa materialista que domina os homens e não hesita nem um pouco em exterminar seres humanos).

É interessante observar que a Ciência Materialista está assentada ao lado de muitos governantes, aconselhando-os, ajudando-os a dirigir as nações e a exterminar pessoas, seres humanos: campos de concentração, câmaras de gás, coletivização dos campos, lavagem cerebral, etc. E é a Ciência que lhes dá grande poder: bombas-atômicas, aviões supersônicos, mísseis balísticos, armas químicas, armas biológicas... Releia o Apocalipse olhando para a Ciência Materialista. Você verá tudo o que eu estou vendo...

Portanto, qual seria a recomendação ? Vamos destruir a Ciência ? A resposta é não. O anticristo é uma fase do apocalipse. E esta fase tem que acontecer. A função do anticristo é enganar, é matar Deus, assumindo, em seguida, o seu lugar. O anticristo quer ser adorado como Deus, ele quer ser Deus. Ele está tentando, e conseguindo, substituir Deus na Terra. E o que temos que fazer é não lhe dar nenhum poder e nem adorá-lo como Deus.

Deus está acima de todas as coisas e a Ciência é só uma técnica. O anticristo não vencerá. Portanto, por mais que faça milagres, cure, etc, a Ciência continua sendo uma técnica, uma técnica que está sendo usada pela besta e pelos falsos profetas para enganar. Por isso, quando lhe disserem que Deus não existe, que a Ciência pode tudo e faz tudo, etc, lembre-se que é o anticristo ou um falso profeta falando.

É preciso pedir a Deus muito entendimento e sabedoria. Precisamos estar atento às coisas que a Ciência está pedindo aos governantes e está querendo fazer na sociedade: células-tronco, clonagem, etc... A Ciência quer dominar e controlar tudo, todos os homens, todas as coisas. Ela não respeita a Vida, pois é inimiga de Deus e de sua criação. Por isso, extermina os homens como se fossem baratas... E quanto maior é o domínio da Ciência e do materialismo, menor é o domínio de Deus e maior é a matança de seres humanos, não respeitam a Vida, não respeitam as Consciências, não respeitam as diferenças: nazismo, stalinismo, maoísmo, etc...

A Ciência é uma técnica. Uma técnica que deve estar assentada na Consciência e não na razão pura. A Ciência fundada na razão pura é a Ciência Materialista que não respeita Deus e não respeita o Homem. Por isso, a Ciência Materialista é o instrumento ideal para a besta e para o falso profeta. Por isso, a Ciência Materialista é o anticristo.

Já a Ciência fundada na Consciência aproxima o Homem de Deus. É uma Ciência que não trabalha para destruir Deus, para destruir as religiões, para destruir o Homem. É uma Ciência que trabalha com entendimento e sabedoria divina. Por isso, respeita as diferenças, respeita o Criador e sua Criação. E será a Ciência do Novo Céu e da Nova Terra.

A Ciência Materialista nos corrompe e mata. A religião fanática nos escraviza. A Consciência, a chama divina que há em cada um de nós, nos aproxima de Deus, o criador de todas as coisas. Por isso, a Ciência deve estar fundada na Consciência e não na razão pura.

Diz o Apocalipse:
3 Também vi uma de suas cabeças como se fora ferida de morte, mas a sua ferida mortal foi curada. Toda a terra se maravilhou, seguindo a besta,
4 e adoraram o dragão, porque deu à besta a sua autoridade; e adoraram a besta, dizendo: Quem é semelhante à besta? quem poderá batalhar contra ela?
5 Foi-lhe dada uma boca que proferia arrogâncias e blasfêmias; e deu-se-lhe autoridade para atuar por quarenta e dois meses.
6 E abriu a boca em blasfêmias contra Deus, para blasfemar do seu nome e do seu tabernáculo e dos que habitam no céu.
7 Também lhe foi permitido fazer guerra aos santos, e vencê-los; e deu-se-lhe autoridade sobre toda tribo, e povo, e língua e nação.
8 E adorá-la-ão todos os que habitam sobre a terra, esses cujos nomes não estão escritos no livro do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo.
9 Se alguém tem ouvidos, ouça.
10 Se alguém leva em cativeiro, em cativeiro irá; se alguém matar à espada, necessário é que à espada seja morto. Aqui está a perseverança e a fé dos santos.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

O miolo da questão
A escravidão gerou uma elite, uma minoria branca, econômica poderosa que controla e domina tudo. Uma minoria que continua disseminando e usando os costumes da escravidão, pois a riqueza que eles possuem veio da escravidão, seja do trabalho escravo, seja do comércio de escravos.

Uma minoria que, atualmente, escraviza tanto os negros, que são pobres pela escravidão histórica, quanto os brancos que nascem pobres pela exclusão econômica atual.

Uma minoria que domina a política, a burocracia, a economia, enfim, todos níveis do Estado. E não deixa que mudanças essenciais acontençam. Eles fazem as leis, eles governam, eles aplicam as leis, eles são os juízes, etc, Estão no poder e querem se perpetuar no poder.

Portanto, a questão do racismo é completamente irrelevante, principalmente porque raça não existe. E se existir só há uma: a raça humana. O miolo da questão é a dominação, a opressão, a exclusão e a exploração imposta por uma minoria branca rica sobre uma maioria negra e pobre.

Inclusive o Professor e ex-governador Cláudio Lembro (Site e textos aqui) é uma pessoa de grande visão, entendimento e sabedoria. Mas, mais do que isto, ele tem que coragem de falar a verdade. Não adianta ter grande entendimento e sabedoria e ficar calado ou colaborar com o mal. É preciso falar e falar na lata.

Disse o professor Lembo: "A elite branca deveria olhar menos para o que acontece no exterior e mais para a realidade social do Brasil".
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Palavras do Professor e ex-governador Cláudio lembro:
SOBRE A ELITE BRASILEIRA

"O Brasil é um país que só conheceu derrotas. Derrotas sociais... Nós temos uma burguesia muito má, uma minoria branca muito perversa"

"Em suas lindas casas dizem que vão sair às ruas fazendo protesto. Vão fazer protesto nada! Vão é para o melhor restaurante cinco estrelas com outras figuras da política nacional fazer o bom jantar".

"Nossa burguesia devia é ficar quietinha e pensar muito no que ela fez para esse País".

"A Casa-grande tinha tudo e a Senzala não tinha nada. Então é um drama. É um País que quando os escravos foram libertados, quem recebeu indenização foi o Senhor e não os libertos, como nos EUA. Então, é um País único. (...) O cinismo nacional mata o Brasil. Esse País tem que deixar de ser cínico. Vou falar a verdade, doa a a quem doer, destrua a quem destruir, por que acho que só a verdade vai construir este País".

SOBRE A REAÇÂO DA ELITE PAULISTANA

"O que eu vi em entrevistas da Folha de S. Paulo foram dondocas dizendo coisinhas lindas. Todos são bonzinhos publicamente. E depois exploram a sociedade, seus serviçais, exploram todos os serviços públicos. Querem estar sempre nos palácios dos governos porque querem ter benesses do governo. Isso não vai ter aqui nesses oito meses".

SOBRE A ELITE BRASILEIRA

"A bolsa da burguesia terá de ser aberta, para sustentar a miséria, no sentido de haver mais empregos, mais educação, mais solidariedade, mais diálogo e reciprocidade de situações".

"Se nós não mudarmos a mentalidade brasileira, o cerne da minoria branca brasileira, não iremos a lugar algum".

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O exército de crime

Roberto Saturnino Braga -- JORNAL – CORREIO BRAZILIENSE – 25.05.2006 – PÁG.29

Senador PT/RJ, é presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado

Arrefecida a tensão da tragédia de São Paulo, discutem-se intensamente muitos subitens do problema da violência urbana – o uso de celulares nos presídios, as benevolências carcerárias existentes, o agravamento supostamente necessário das penas –, mas ignora-se o fato principal: que o crime organizado dispõe de um exército com grande poder de fogo, comandado por chefes de dentro dos presídios ou por outros que logo os substituem quando eles faltam. O gravíssimo é que existe esse exército organizado capaz de fazer frente à polícia de igual para igual, cessando fogo mediante negociação entre poderes. Isso sem falar do outro exército, também numeroso mas inorgânico, de assaltantes maiores e menores que enchem as ruas das cidades.

Que fenômeno é esse? Que enorme bando é esse de brasileiros que ignoram a lei, o Estado, a República, os valores da moral, da justiça, da humanidade? Como e por que se formou essa legião de bárbaros dentro da sociedade? Como reverter a formação? E como tornar mais eficaz, a curto prazo, nossa polícia para enfrentá-los? Essas são as questões principais que, antes de todas, precisam encontrar resposta.

Houve falta de investimento em educação nas décadas passadas? Evidentemente houve, a constatação é consensual. Houve falta de emprego, falta de oportunidade para uma vida digna? Sim, é outro consenso. Cresceu a massa de pobreza absoluta? Desagregou-se a família, a religião? Sim, também. Esses são fatores efetivamente importantes na formação daquelas legiões. Mas que ainda não explicam tudo a meu juízo. Há que somar outras causas para se ter um efeito tão grande e assustador. Penso, principalmente, no enorme, vasto e profundo sentimento de injustiça que cresceu na alma do nosso povo mais carente e vitimado nos últimos 20 anos. Esse sentimento de injustiça gera ódio nos corações mais agressivos e gera cinismo absoluto, insensibilidade nos mais fracos de caráter. E esse sentimento do povo carente é gerado pela injustiça estrutural e abissal da nossa sociedade e no cinismo com que a nossa “elite branca perversa” (Cláudio Lembo) a encara, achando que é natural, resultante das diferenças de competência e de disposição para o trabalho, decorrente da falta de “competitividade” deles no mercado – os trabalhadores mais pobres – e o mercado tem que ser acatado, ele é que decide, é a racionalidade, não há nada a fazer.

Pois o mercado não decide nada; quem decide é precisamente esse sindicato do cinismo que manda na economia brasileira; eles decidem que é o mercado quem deve decidir, e o povo que se vire. A sociedade, porém, pode decidir, politicamente, que os critérios de distribuição dos frutos do trabalho não são apenas os do mercado e da “competição”, mas também os da justiça, os da solidariedade, os do congraçamento social. Critérios, estes outros, que devem ser implementados pelo Estado, pela sua presença na economia e pelo planejamento, que a elite cínica quer evitar a todo custo, e conseguiu fazê-lo nas décadas perdidas do neoliberalismo.

É claro que esse novo paradigma é viável; trata-se de um confronto político que está acontecendo no país. Se a elite endinheirada e cínica não bota a mão no bolso para ajudar os mais carentes (Cláudio Lembo), o Estado tem de meter a mão no bolso dela, legitimamente, taxando fortunas e ganhos de capital e pagando juros baixos, para investir muito mais na educação, sim, mas também nas favelas, na habitação digna, no saneamento.

Mudar o modelo, eis aí. Encerrar a era neoliberal. É muito difícil, todos sabemos, enfrentar os gigantescos interesses do capital. Mas temos que tentar; junto com a América do Sul, para ficar menos difícil. Dialogando com a França também, que é o único país rico a manifestar resistência àqueles interesses. Enfim, é o principal que temos de fazer, pensando num Brasil mais justo e menos violento.

Mas é evidente que temos que cuidar, de imediato, da eficácia da polícia. Temos que aumentar seus efetivos, que são muito baixos (algo como cinco vezes menos policiais em ação por 1.000 habitantes que nos países ricos). Temos que preparar ainda melhor esses efetivos, como tem feito a Força Nacional; temos que usar mais as tecnologias avançadas, a do geoprocessamento, por exemplo, que permite monitorar todas as ruas da cidade 24 horas por dia. Não entro a fundo nessa discussão porque não sou do ramo, mas é claro que ela é importantíssima – e, a curto prazo, todos dependemos dela.