A assistência estudantil no âmbito da política de Educação Superior Pública
Jolinda de Moaes Alves*Texto completo em: http://www.ssrevista.uel.br/c_v5n1_Jo.htm
O acesso e a capacidade de permanência e sobrevivência dos estudantes, no decorrer do período de estudos, deveria resultar de uma condição democrática, já positivada como direito na Constituição Federal de 1988, que afirma que a educação é dever do Estado e da Família (art. 205, caput) e tem como princípio a igualdade de condições de acesso e permanência na escola (art. 206, I).
Art.205 ? A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho
Art. 206 ? O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I- Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola .
Esta mesma direção encontra-se expressa na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, sancionada em 20/12/96, com dispositivos que amparam a assistência estudantil, entre os quais se destaca o Artigo 3º, "O ensino deverá ser ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; (...)"
A busca da redução das desigualdades socioeconômicas faz parte do processo de democratização da universidade e da própria sociedade brasileira. Essa democratização não se pode efetivar apenas mediante o acesso à educação superior gratuita. Torna-se necessária a criação de mecanismos que garantam a permanência dos que nela ingressam, reduzindo os efeitos das desigualdades apresentadas por um conjunto de estudantes, provenientes de segmentos sociais cada vez mais pauperizados e que apresentam dificuldades concretas de prosseguirem sua vida acadêmica com sucesso.
O Plano Nacional de Educação[3], aprovado em 10 de janeiro de 2001, atendendo a uma reivindicação direta do FONAPRACE, determina a adoção de programas de assistência estudantil, tais como bolsa-trabalho ou outros destinados a apoiar estudantes carentes que demonstrem bom desempenho acadêmico.
A Lei de Diretrizes e Bases determina que "a educação deve englobar os processos formativos e que o ensino será ministrado com base no princípio da vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais" (Lei n. 9.394, de 29/12/96, artigo 1º, parágrafos 2º e 3º, inciso XI)
Esses princípios legais levam à reflexão e à revisão das práticas institucionais. Cabe às IES públicas assumir a assistência estudantil como direito e espaço prático de cidadania, buscando ações transformadoras no desenvolvimento do trabalho social com seus próprios integrantes. Entretanto, as universidades brasileiras têm encontrado limites para cumprir os próprios preceitos da lei e do Plano Nacional de Educação.
Nesse aspecto, sobre nossas universidades, FARIA afirma:
Podemos dizer que, genericamente, sem perder de vista as experiências e iniciativas diferenciadas, a assistência não é considerada como um espaço de ações educativas e de produção e transmissão do conhecimento, convivendo com sua marginalização no conjunto das prioridades acadêmicas e administrativas. (FARIA, 1993, p. 208)
Desta forma as políticas assistenciais acabam ficando minimizadas ou esquecidas, pois não há investimento do governo em programas de assistência aos estudantes das universidades. Tendo como fundamento a legislação citada, o FONAPRACE (1997), propôs a implantação de um Plano Nacional de Assistência que atenda ao estudante de baixa renda, buscando reduzir as desigualdades sociais e permitir a expressão de seu potencial durante a vida acadêmica.
A Pesquisa sobre o Perfil Sócio-econômico e Cultural realizada pelo MEC / INEP (1998), nas Instituições Federais de Ensino Superior, indicou parâmetros para definir melhor os programas e projetos a serem desenvolvidos nas instituições.
No perfil geral, os estudantes são jovens, saudáveis, mulheres em sua maioria, solteiras, sem filhos, morando com a família; têm na figura paterna o principal provedor e locomovem-se por meio de transporte coletivo. Procuram as IFES pela sua gratuidade e qualidade de ensino, buscando desenvolver suas aptidões pessoais com o ideal de contribuir para mudar a sociedade. Lêem pouco, informam-se através dos telejornais, divertem-se dançando e freqüentando barzinhos, envolvem-se pouco com movimentos sociais, têm a atividade física como lazer e preferência pela caminhada. O capital cultural[4] é expresso, sobretudo, pelo grau de instrução dos pais. Existe uma parcela de alunos que migrou para estudar e que não conta em seu cotidiano com o convívio familiar.
Os resultados da pesquisa nas IEFs ? Instituições Federais de Ensino, demonstraram ainda os principais indicadores sociais de sobrevivência: moradia, alimentação, transporte, saúde, manutenção e trabalho.
A variável local de moradia antes do ingresso do estudante na universidade torna-se um importante indicador de sua qualidade e condições de vida. A pesquisa apontou que 34,79% dos estudantes se deslocam de seu contexto familiar, ao ingressarem na universidade, apresentando, portanto, necessidade de moradia e apoio efetivo.
No que concerne à alimentação, o Restaurante Universitário (RU) constitui importante instrumento de satisfação de uma necessidade básica, educativa, de ação social e de convivência universitária de 19,10% dos estudantes pesquisados.
Torna-se necessário criar, manter e ampliar os programas que garantam o apoio à alimentação dos alunos de baixa renda, principalmente os serviços dos restaurantes universitários, como forma de garantir a permanência do estudante no campus, dando-lhes oportunidade para otimizar seu tempo de vida acadêmica e contribuindo para seu melhor desempenho e formação integral. Dada a sua importância para a vida acadêmica, é fundamental que o RU seja, também, em espaço gerador de atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Trabalhar e estudar é uma condição que se constata em todas as categorias socioeconômicas, embora o percentual de estudantes que exercem atividades não acadêmicas remuneradas seja mais elevado nas categorias provenientes das classes populares.
Verificou-se que a inserção dos estudantes em atividades acadêmicas remuneradas é tímida, pois apenas 16,83% do universo total pesquisado participavam desses programas. Deve-se, no entanto, considerar o número e a remuneração dos programas em questão.
A tendência para a busca da automanutenção apresentada pelos estudantes, aliada à baixa oferta de programas acadêmicos remunerados, apontavam para a necessidade de sua ampliação, estimulando-se a inserção dos estudantes de baixa renda nas atividades de ensino, pesquisa e extensão, respeitado o desempenho acadêmico.
A maioria dos estudantes (60,60%) utiliza transporte coletivo para deslocamento até a universidade. Isso indica a necessidade de políticas articuladas com órgãos responsáveis pelo transporte urbano a fim de garantir acesso aos campi a custos baixos.
Os estudantes das categorias de maior vulnerabilidade social são os que mais freqüentam os serviços públicos de saúde. Com relação à freqüência a consultas odontológicas, eles são aqueles que procuram o dentista apenas em casos de emergência ou eventualmente, indicando uma saúde bucal precária.
Apesar da pesquisa não ter detalhado itens mais específicos de saúde, se levar-se em conta que 21,41% dos estudantes têm menos de vinte anos, podem ser identificados alguns temas considerados desafiadores dessa faixa etária, que demandam programas de saúde específicos: prevenção de DST/AIDS; planejamento familiar; saúde mental, dependência química e saúde bucal.
Outra demanda importante a ser considerada refere-se à prevenção de acidentes no exercício de atividades curriculares. A aquisição de equipamentos de proteção individual para os usuários de laboratórios e em atividades de risco é uma necessidade imperiosa.
Para o FONPRACE (1997) "torna-se imperativo sensibilizar as autoridades , os legisladores e a Comunidade Universitária para a importância da Assistência como parte de um projeto acadêmico que tem a função fundamental de formar cidadãos qualificados e competentes." Nesse sentido a assistência estudantil é compreendida como um investimento.
(...)
Considerações finais do texto
Na política de educação, a assistência tem o papel de mobilizar de recursos de forma a garantir a permanência e o percurso dos estudantes socialmente diferenciados no processo de formação profissional.
Uma vez que sua capacidade intelectual e de formação básica já foram avaliadas e aprovadas no processo seletivo de acesso à Universidade , deixar de apoiar esses alunos de baixa renda seria uma perda irreparável.
Assim sendo, a condição sócio-econômica deixaria de ser uma variável negativa ou mesmo impeditiva do percurso universitário e, independentes dela, todos os estudantes poderiam ter igual acesso ao saber e à produção do conhecimento nesta Instituição de Ensino Superior.
Compreender a assistência estudantil como parte da Política Educacional significa assegurar um componente mobilizador da educação, cujo acesso pode e deve se estender igualmente a todos os segmentos sociais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário